quarta-feira, 9 de novembro de 2011

Da dívida da Alemanha à Grécia

"Os alemães não andam muito divertidos. Basta olhar para os tablóides ou para os blogues para se perceber que a opinião pública está em ponto de ebulição. Obrigados a financiar mais um aumento da dívida pública e mais um resgate das contas, os alemães começaram a questionar tudo, desde a sensatez de apoiar a Grécia ao próprio Euro, e chegam a pôr em causa as vantagens da integração europeia. Isto pode parecer estranho num país que está perto de não ter desemprego e de recuperar o primeiro lugar aos chineses nas exportações. Mas os alemães dizem que estão fartos: chega de subscrever a integração europeia, chega de pagar tudo e mais alguma coisa, e seguramente chega de resgates à Grécia.


Contudo, o que é verdadeiramente bizarro é a curta duração da memória colectiva da Alemanha. Durante grande parte do século XX, a situação era radicalmente diferente: depois da Primeira Guerra Mundial e novamente após a Segunda Grande Guerra, a Alemanha tornou-se o país do mundo com maior dívida externa, e em ambos os casos a sua recuperação económica apenas foi possível com o perdão generalizado da dívida.

A crise da dívida alemã entre guerras começou há exactamente 80 anos, nos últimos dias de Junho de 1931. O que a espoletou foram os empréstimos excessivos contraídos nos últimos anos da década de 20 para pagar indemnizações. Uma bolha no crédito foi o resultado, e quando rebentou, em 1931, acabou com as indemnizações, o preço do ouro e, mais importante, a democracia de Weimar.

Os americanos adiaram o pagamento da dívida para depois da Segunda Grande Guerra, até terem imposto em 1953 aos seus aliados o acordo para a dívida de Londres, um exercício de perdão da dívida da Alemanha em termos bastante generosos. O milagre económico da RFA, a estabilidade do marco alemão e a saúde das suas finanças públicas foram o resultado deste generoso perdão. Mas colocou os credores da Alemanha em desvantagem, ao verem-se confrontados, eles próprios, com as consequências financeiras da ocupação alemã.

Na verdade, o acordo de dívida de Londres adiou a questão das indemnizações - incluindo o pagamento de dívidas de guerra e o dinheiro dos impostos nos países ocupados pela Alemanha durante a guerra - para uma conferência a ter lugar depois da reunificação. Esta conferência não chegou a acontecer: desde 1990, os alemães teimosamente têm-se recusado a abrir esta caixa de Pandora. As poucas indemnizações pagas, a maior parte a trabalhadores escravizados, foram canalizadas através de ONG's, sobretudo para não ser aberto um precedente. Apenas um país se tem oposto abertamente a este procedimento, tendo tentado ser compensado através dos tribunais: a Grécia.

Terá sido ou não sensato ter deixado de parte a questão das compensações e indemnizações da Alemanha depois de 1990. Nessa altura, os alemães argumentavam que qualquer pagamento plausível excederia os recursos do país, e que uma contínua cooperação financeira na Europa seria infinitamente mais desejada. Poderiam ter alguma razão. Mas agora é tempo da Alemanha cumprir a promessa, agir sabiamente e afastar o elefante da loja de porcelanas."


retirado do arrastão.blogspot.com


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