quinta-feira, 30 de julho de 2015

Violência e ideologia



Violência e ideologia mauro 


Assistimos ao espetáculo da violência. A própria frase encerra seu significado mais dramático. Parte das pessoas encara a violência no papel de espectadores e a consomem pelo filtro dos meios de comunicação – seja a televisão, o rádio, as redes sociais. Sujeitos apassivados adornianamente pela indústria cultural, transformados em espectadores que expectoram catarticamente para o vídeo burro seus anseios e frustrações, para vê-los realizados pelo outro inexistente, tornando-os vazios.

A raiva, a violência, a fúria, mas também a paixão romântica, a aventura ou fantasia, projetam desde fora os elementos do ser social, projetado para fora de si mesmo para se reconhecer no outro. Tal mecanismo não é necessariamente de estranhamento, se pensarmos que assim nos constituímos como seres sociais, se reconhecendo no outro. O problema é a natureza e qualidade deste outro.

A mercantilização da arte e da comunicação reconstrói o objeto de projeção de forma a retirar dele toda a contraditoriedade viva. A massificação sob a forma mercadoria é necessariamente padronizadora, repetitiva, metódica e, em uma palavra, burocrática. Inseparável da reificação, como já dizia Marx quando afirmava que está é a maldição inevitável dos produtores quando assumem a forma de mercadorias. Uma relação entre seres humanos que assume a fantasmagórica forma de uma relação entre coisas.

Aquele que se relaciona com o vídeo ou a pequena tela onde vivem as “redes sociais” é já, antes de tal ato, uma coisa. Reificado pela vivência de relações reificadas, coisificado na compra e venda de sua força de trabalho, na relação com os demais mediados por coisas e pela lei do valor, pelo mercado. No entanto, aquele que se coisifica é ainda um ser humano coisificado e isso é um problema.

A força de trabalho pode ter sido convertida em mercadoria, as necessidades humanos em meios de realização do valor de troca, mas tais dimensões não podem existir fora dos seres que a possuem. Para desespero do capital, os seres humanos e seus problemas comezinhos, são o veiculo portador da principal mercadoria da forma capitalista, assim como aqueles que em seu consumo a realizam.

Um ser social e histórico que vive e respira, que precisa comer, vestir-se, habitar, que fica doente e que se apaixona, canta, olha seus filhos com esperanças descabidas, que sente a carne cortada por injustiças, por isso se revolta e por isso luta. Em suas veias não corre apenas a substância abstrata do valor, mas sangue que ferve e, às vezes, explode.

O capital não pode explorar o trabalho sem atingir o conjunto da humanidade e os seres que a compõe. Não pode evitar, portanto, que esta forma superior de exploração não produza seu contrario: a revolta. Por isso, toda forma de exploração é, inevitavelmente, uma forma de dominação.

A dominação não é um ato simples que resulta do mero uso da força, ainda que esta seja um meio indispensável. O velho Maquiavel já alertava há muito tempo que nenhuma ordem se mantém só pela espada e funda a política moderna afirmando que o domínio resulta da exata combinação da coerção e do consenso.

Se por uma lado a força coercitiva é explicita, as formas de violência não o são. É violenta a ação criminosa da Polícia Militar que assassina jovens nas periferias e favelas, mas é violento também o racismo que a enquadra, a opressão sobre migrantes e imigrantes, assim como é ainda mais violenta a manifestação de integração dos oprimidos e explorados como sujeitos de sua própria dominação quando se amoldam a ordem que os massacra.

No entanto, esta integração não é um ato de convencimento. Os explorados e oprimidos não aceitam a ordem porque foram convencidos de sua superioridade societária ou porque portam os melhores valores de nossa melhor sociedade. A ideologia não é um ato meramente cognitivo, não é um mero conjunto de ideias transmitidas e assimiladas por falta de crítica. Isso pensavam os críticos – críticos que Marx e Engels ironizavam impiedosamente em sua obra A ideologia alemã.

Se a ideologia é um mero conjunto de ideias que falsificam o mundo para favorecer a dominação, bastaria oferecer as ideias corretas. Daí resulta que não apenas os apóstolos do novíssimo testamento como Bauer e Stirner, mas boa parte da esquerda contemporânea se empenha em disputar com os meios de comunicação da burguesia com golpes risíveis de suas precárias iniciativas comunicacionais.

A ideologia é um fenômeno mais complexo. São as relações sociais dominantes expressas como ideias, as relações que fazem de uma classe a classe dominante, as ideias de sua dominação. Por esta aproximação não se trata de mudar uma fraseologia do mundo por outra, mas de mudar o mundo, um ato prático, uma revolução. E uma revolução é um ato violento de negação, uma ruptura.

Voltemos, então, à frase inicial: assistimos ao espetáculo da violência. Inseridos nas relações que constituem a ordem do capital que degrada o ser humano a mera coisa, o trabalho em meio de vida, e a vida em meio pelo qual o valor se valoriza, os seres humanos subsumidos à ordem reificada vivem contradições que geram raiva e indignação porque se confrontam com seu ser e o aviltam.

Diante disso poderiam viver esta contradição, rebelar-se. Mas isso é muito perigoso. Aqui entra em cena o mecanismo da catarse. Oferece-se a estes seres angustiados uma caixinha de alternativas mágicas através das quais ele pode perder-se numa ilha deserta, viajar aos confins do espaço (onde nenhum homem já foi), amar perdidamente, mas, também, sofrer, morrer em explosões, matar, trair, derrubar regimes, salvar seu pais em atos heroicos. Em poucas palavras, como no velho teatro grego de onde deriva o termo, realizar no outro e pelo outro aquilo que em seu ser latejava como necessidade, e o que é fundamental, abdicando de fazê-lo. Eis a catarse.

É por isso que, enquanto Gramsci via positivamente a catarse como passagem do momento econômico corporativo ao ético-politico, Brecht declara guerra à catarse em seu teatro. Ambos vêem facetas diversas do fenômeno. O sardo foca a necessidade de superar o egoísmo que isola os membros da classe trabalhadora pela necessária identidade de classe que liga cada um de nós na meta política da transformação revolucionária; enquanto o alemão chama atenção para o mecanismo pelo qual através da arte (e diríamos nós pela comunicação de massas) rouba a revolta de cada um impedindo a ação que resultaria nesta identidade de classe esperada.

Nesta segunda acepção, a catarse é um ato violento de expropriação da revolta, da angustia, da raiva que produz o apassivamento. Para que isso seja possível a pessoa precisa se tornar espectador e a violência espetáculo.

E não se iludam: isso acontece até mesmo em nossos espelhos tão queridos. Nas “redes sociais” em que filtramos os amigos para que nossas ideias pareçam ter eco em muitos outros que pensam o mesmo. Aí vai mais um post para que você se indigne, ou se emocione, ou ria, ou se revolte. E se gostou, curta e compartilhe nesta incrível relação entre seres humanos que se apresenta na forma fantasmagórica de uma relação entre smartphones.

Há um certo tempo ouvi uma propagando no rádio (uma espécie de rede social precária que os antigos frequentavam) na qual se anunciava um site que tinha o significativo título de “faça alguma coisa.com”. O locutor dizia: “se você está indignado, acredita que nem tudo está como devia, clique em nosso site – http://www.facaalgumacoisa.com –, e você já estará fazendo alguma coisa”.
Infelizmente, para a ordem, nem todos estão assistindo o espetáculo da violência. Alguns de nós estão vivendo a violência. São Mães que perderam seus filhos para a Polícia Militar assassina, são trabalhadores que adoecem sugados pela sanha do capital em extrair mais valia, são jovens jogados no chão sentindo a bota do carrasco sobre suas cabeças, são professores tomando porrada da policia, são famílias vendo suas casas derrubadas para dar lugar a horripilantes prédios de aço e vidro ou vias por onde correm carros sem alma.

As vezes, quando moradores da favela estão sendo atacados, estudantes de uma universidade pública – a UERJ – levantam os olhos de seus celulares e atravessam a rua e compartilham a raiva, a sagrada raiva da revolta. O imbecil do reitor (ou feitor?) afirmou depois de chamar a policia e jogar jatos d’água na moçada que “com a barbárie não há dialogo”. Sou obrigado a concordar com ele, apenas o espantaria o fato que o personagem que lhe cabe nesta trama é o da barbárie.
Comentando a nona tese de Walter Benjamin, na qual o autor se refere ao quadro Ângelus Novus de Paul Klee, Žižek afirma que:

“E se a violência divina fosse a intervenção selvagem desse anjo? Ao ver o amontoado de escombros que cresce em direção ao céu, esses destroços da injustiça, o anjo contra-ataca de vez em quando para restabelecer o equilíbrio, vingando-se do impacto devastador do “progresso”. Não poderia a história da humanidade ser vista como uma normalização crescente da injustiça, trazendo consigo o sofrimento de milhões se seres humanos sem nome e sem rosto? Em que lugar na esfera do “divino”, talvez estas injustiças não tenham sido esquecidas. Acumulam-se, os erros são registrados, a tensão aumenta e torna-se insuportável, até o momento em que a violência divina explode numa cólera de retaliação devastadora.” (Violência, São Paulo: Boitempo, 142)

O discurso ideológico sobre a violência, sua espetacularização, que é outra forma de referir-se à sua mercantilização, cumpre, então, uma função além de sua distorção ou negação. A violência é simultaneamente louvada e negada, mas a função última é negar a possibilidade da violência revolucionária pela vivência catártica da violência vazia de substância. Oferecer uma violência ao consumo passivo, para que não seja possível o ato prático de negação violenta da ordem.

Agora, nesta cidade, homens e mulheres estão caminhando para o matadouro do trabalho subsumido ao capital, casas estão sendo derrubadas, um jovem negro está caído pedido por sua vida quando a bala procura sua cabeça, um corpo ensanguentado pela tortura foi jogado numa cela, um coração se partiu de tristeza, uma palavra sufocou de silêncio seu portador…

Nada de triste existe que não se esqueça
alguém insiste e fala ao coração
tudo de triste existe e não se esquece
alguém insiste e fere no coração
nada de novo existe nesse planeta…

As pessoas estão capturadas pela tela azulada na qual se vive a vida de que elas abriram mão. Pelas ruas, em qualquer canto, nucas tortas carregam os que já foram pessoas e pequenos dispositivos sugam os olhos por onde se esvai a alma até onde se escondem impulsos e fluxos que substituem a relação entre os seres humanos… Quem sabe se levantarmos os olhos?    

em volta dessa mesa velhos e moços
lembrando o que já foi
em volta dessa mesa existem outras falando tão igual
em volta dessas mesas existe a rua
vivendo seu normal
em volta dessa rua uma cidade sonhando seus metais
em volta da cidade…*

Um anjo abre suas enormes asas negras sobre o caos, mas ninguém o vê. Anjos não tiram selfies.

* Esse eu não vou dizer de quem é! Quem não souber que musica é esta… procure no Google, ou pergunte para um amigo… se ainda tiver algum de verdade.

terça-feira, 28 de julho de 2015

A fraude da austeridade



Ainda não teve resposta por parte do Governo a Pergunta apresentada pelo PCP sobre os destinos das verbas obtidas através do "empréstimo" da troika estrangeira que foi apresentada há 25 dias atrás. Essa pergunta pode ser consultada aqui.

A resposta não é fácil e sem a ajuda do Governo será muito difícil compreender para onde terão ido os 78 mil milhões de euros que o Estado Português, com a assinatura do PS, PSD e CDS, contraiu como dívida e sobre a qual todos pagaremos os juros e as consequências políticas. Sim, os juros e as consequências políticas. Que o credor, neste caso, não se limitou a emprestar o dinheiro e exigir o pagamento do capital e dos juros. Foi muito além disso e exigiu o cumprimento de um programa político anti-democrático, anti-popular e anti-nacional, baseado naquilo a que chamam "austeridade".

Mas umas contas simples fazem-nos perceber que o "empréstimo" não entrou nas nossas contas. Vejamos, o PIB contraiu cerca de 6% entre 2011 e 2014, o que equivale a cerca de 10 mil milhões de euros produzidos a menos em Portugal. Uma quantia semelhante desapareceu dos gastos do Estado com Educação, Saúde, Cultura, Prestações Sociais e investimento público. Ou seja, o orçamento do Estado diminuiu em proporção com a queda do PIB, sem consumir verbas adicionais, ou seja, não entrou dinheiro no sistema. Para onde foram então os 78 mil milhões?

Ao mesmo tempo, entre 2011 e 2015, a dívida pública aumentou 50 mil milhões de euros e as despesas anuais com juros da dívida aumentaram de 4 300 milhões para 8 500 milhões. Nesse mesmo período, a Banca conseguiu eliminar 30 mil milhões de euros de imparidades com recurso a dívida garantida pelo Estado.

A "crise das dívidas soberanas" não passa de uma crise da banca, por ter usado o dinheiro dos depositantes como manancial para os negócios de banqueiros empreendedores e aventureiros. Aquilo a que chamam "austeridade" não é mais do que o Estado a ser chamado a pagar os buracos deixados na banca, porque os bancos se tornaram "demasiado grandes para falir". O problema é que também são "demasiados grandes para resgatar". Como tal, é preciso cortar nas despesas do Estado para assegurar que existem suficientes "almofadas" para a banca. Os 78 mil milhões que o Estado português contraiu de dívida junto da troika ocupante foram para os bancos. Cada tostão.

aqui:http://manifesto74.blogspot.pt/2015/07/a-fraude-da-austeridade.html#more

A Tecnoformacia

domingo, 26 de julho de 2015

Maria Lucia Fattorelli apresenta seus achados de Auditoria da Dívida Grega no Parlamento

Apresentação do capítulo 4 do Relatório Preliminar da Auditoria da Dívida Grega, que trata dos mecanismos que permitiram a troca de papéis podres por títulos soberanos em favo dos bancos e em prejuízo do povo e do Estado grego.
Parlamento Helênico - Atenas - 17/06/15

quinta-feira, 23 de julho de 2015

A DÍVIDA E O PAI NATAL

por


O primeiro ministro de Portugal em exercício, mais o seu vice, mais o resto do governo, mais os ex-governantes e respectivos deputados, enfim, o “arco da governação” que chamou e alimentou a troika continuam a querer fazer de todos nós imbecis. É que a dívida pública portuguesa, além de ser parte de uma dívida soberana incobrável, no que não difere da situação grega mais milhar de milhão menos milhar de milhão, continua a subir como um míssil - mas em absoluto descontrolo - enquanto os responsáveis pelo fenómeno trocam culpas e acusações exigindo às vítimas que continuem a lançar os seus cada vez mais minguados rendimentos para um poço sem fundo.
Portugal é diferente da Grécia? Será… Mas apenas por enquanto, porque para lá caminha e outros se seguirão se os candidatos a imbecis, que somos todos nós vivendo dentro da União Europeia e da Zona Euro, não lhes dissermos que já chega.
Não se pense que os dados demonstrativos de que a dívida trepa sem cessar resultam de contas distorcidas elaboradas por mal-intencionados economistas de esquerda, como o “arco” e seus cúmplices gostam de argumentar. Os números são do Banco de Portugal, e se a instituição em si mesma, ou pelo menos quem a dirige, não deva ser considerada de confiança, os valores parecem sê-lo, porque se fossem alvo das conhecidas marteladas estatísticas não apareceriam tão nus e crus ante os nossos olhos.
Pois revela o Banco de Portugal que num só mês, de Abril para Maio, a dívida pública portuguesa cresceu 3777 milhões de euros, atingindo a soma astronómica de 229204 milhões de euros, uma coisa que chega quase aos 20850 euros por cada português – um pouco mais porque, como sabemos, as elites estão dispensadas de participar neste “esforço nacional”. Ou seja, só num mês a dívida pública portuguesa cresceu quase cinco por cento do valor total da “ajuda” da troika, como se sabe no valor de 76 mil milhões e que tinha como objectivo proclamado pelos governos responsáveis pagar uma dívida que cresce…Cresce… Cresce…
Recordando um pouco os argumentos dos últimos primeiros-ministros portugueses, sempre indispostos para renegociar a dívida, o que, segundo eles, seria coisa de “caloteiros”, os caminhos para sermos uns devedores bem comportados estão bifurcados em austeridade e competitividade, panaceia esta que nos transformaria em bons exportadores e menos bons importadores, assim se virando a balança comercial a nosso favor. Pois bem, ou mal, neste caso, sobre os efeitos da austeridade na vida dos cidadãos, provocando ainda o caos no tecido económico nacional, estamos conversados; quando à balança comercial, eis o que também nos diz o Banco de Portugal: nos cinco primeiros meses deste ano o défice foi de 911,1 milhões de euros, contra um balanço também negativo de 776,1 milhões no mesmo período do ano passado. A panaceia fracassou, como se sabia e o governo contrariava a pés juntos com base em meros e episódicos afloramentos positivos.
O Banco de Portugal, que por esta via não tardará a engrossar as “forças de bloqueio” apontadas a dedo pelo primeiro-ministro em exercício e seu excitado vice, diz-nos ainda que as contas externas do país registaram de Janeiro a Maio um défice de 103 milhões de euros, um valor que – reparem nisto – traduz uma degradação de 471,6 milhões em comparação com os primeiros cinco meses de 2014.
Eis pois, senhoras e senhores, o país saudável e recuperado, como ele gosta de dizer, que o senhor primeiro-ministro de Portugal nos deixa a menos de três meses das próximas eleições gerais. Ele, coitado, diz-se enganado pelo governo anterior, e por isso teve de aumentar brutalmente os impostos quando prometera diminuí-los, carregou selvaticamente na austeridade quando jurara acabar com ela, expulsou quase meio milhão de portugueses depois de garantir que viria aí emprego e crescimento económico. Enquanto a dívida soberana, de 102 por cento do PIB há quatro anos já passou por cima dos 130 por cento e assim continua a galope.
Pois se ele se diz enganado pelo anterior governo, os cidadãos foram burlados por ambos e também por quantos os antecederam até ao primeiro – já lá vão décadas – que resolveu ajustar contas com o 25 de Abril a coberto dos interesses malfeitores que gerem a União Europeia e a moeda única.

É oficial: se daqui dois meses e picos os portugueses aceitarem ir pelos mesmos caminhos é porque acreditam no pai natal e outros mitos mágicos.


sábado, 18 de julho de 2015

Prisão de povos*

por Jorge Cadima 

A «ajuda» da troika foi para a banca. Para os povos ficaram as dívidas públicas, que explodiram nos anos das troikas. São impagáveis, mas servem de pretexto para levar os povos à miséria, aumentar a exploração e impor relações de tipo colonial aos países endividados. É isto a UE: uma ditadura ao serviço do grande capital financeiro e uma autêntica prisão de povos. 

Os acontecimentos dos últimos dias mostram à saciedade que a UE/Euro é incompatível com a democracia, a soberania e o bem-estar dos povos. É uma ditadura ao serviço do grande capital financeiro e uma autêntica prisão de povos. Como o PCP tem afirmado, esta UE não é reformável. Apenas sobre os seus escombros poderá haver futuro para os povos.

Os empréstimos ao abrigo dos programas das troikas são obra de agentes do grande capital financeiro (como o presidente do BCE, Draghi, homem da Goldman Sachs) para benefício do grande capital financeiro. A banca privada era credora de boa parte da dívida grega em 2010 e prosperava com os respectivos juros, mas decidiu pôr-se a salvo quando a crise estoirou. Tal como cá, o dinheiro das troikas nem entrou na Grécia: foi parar directamente aos credores – o capital financeiro parasitário – transferindo as dívidas para o BCE, o FMI e os bancos centrais nacionais. A «ajuda» foi para a banca. Para os povos ficaram as dívidas públicas, que explodiram nos anos das troikas. São impagáveis, mas servem de pretexto para levar os povos à miséria, aumentar a exploração e impor relações de tipo colonial aos países endividados.

As tão badaladas «obrigações dos devedores» são à la carte. O principal jornal do grande capital inglês, o Financial Times, dedica um editorial (11.6.15) a outro país europeu que está na falência: a Ucrânia. Titula o FT: «Os credores da Ucrânia têm de partilhar a dor do país» e «têm de aceitar um haircut [perdão de dívida]». Informa que há um «pacote de apoios internacional […] que admite a reestruturação da dívida e cortará os juros a pagar em 15,3 mil milhões de dólares nos próximos quatro anos» para que «sejam geríveis em relação à produção económica» do país. Acrescenta que há credores privados que «resistem a um perdão da dívida», mas sentencia: «terão de ceder. Têm uma obrigação moral em concordar com a reestruturação que permitirá reduzir a dívida para níveis sustentáveis». E defende «a utilização de mecanismos de indexação ao PIB», solução que considera «a melhor para todas as partes», até porque «a História mostra que, mesmo após um incumprimento [default], os investidores privados regressam rapidamente quando a economia recomeça a crescer». Remata o FT: «em matérias de tal importância geopolítica, não se pode permitir que os interesses financeiros privados ditem as políticas públicas». A adulta directora do FMI, Lagarde, já «assegurou à Ucrânia que os fundos [do FMI] continuarão disponíveis, mesmo que o país falhe nos pagamentos aos seus credores privados» (Deutsche Welle, 13.6.15). Esta duplicidade gritante de critérios é explicada pelo FT: a Ucrânia «tem o governo mais reformista desde a independência […] que está a concretizar grandes cortes nos subsídios estatais». Se o combativo povo grego tem de ser castigado e humilhado pela sua ousadia de resistir, já os golpistas e fascistas ucranianos, que impõem políticas troikeiras do imperialismo pela violência, o terror e a guerra, merecem apoio e perdões de dívida. Medite-se ainda sobre uma terceira dívida, afastada destas considerações políticas. O FMI acaba de recusar qualquer perdão de dívida ao Nepal, país devastado em Abril deste ano por um enorme terramoto que matou 8600 pessoas e destruiu mais de 500 mil casas. A destruição não foi considerada suficiente (catholicireland.net, 30.6.15).

Os acontecimentos dos últimos dias são portadores de importantíssimos ensinamentos sobre a verdadeira natureza da dominação de classe, do imperialismo, da União Europeia e da social-democracia (nas suas várias expressões). A humilhação do governo grego mostra que se paga caro as ilusões de que é possível reformar esta UE.

*Este artigo foi publicado no “Avante!” nº 2172, 16.07.2015

aqui:http://www.odiario.info/?p=3711
 

terça-feira, 14 de julho de 2015

Este texto não é sobre a Grécia

por

Nem sobre Portugal, ou Alemanha. Também não é sobre austeridade, nem sobre resultados de referendos.

Na verdade, ao falar-se de União Europeia, excluem-se os povos que alimentam esse projecto imperialista, entre os quais o Grego, o Português, o Alemão. Porque falar de União Europeia não é falar de Europa, que é um continente, um vasto conjunto de países, que cá continuarão muito após o colapso do projecto de espoliação que é a União Económica e Monetária e a União Política.

Este texto não é sobre austeridade porque "austeridade" é a capa sob a qual se esconde o capitalismo. O capitalismo não é austero porque austeridade pressupõe rigor e contenção no uso de recursos. O capitalismo é o inverso disso: é a destruição dos recursos naturais e a exploração do trabalho, com desperdício incalculável. O capitalismo, que agora dá pelo pomposo nome de "austeridade", faz produzir o dobro do que todos os habitantes globo inteiro necessitariam para viver, mas deita fora metade do que produz e mesmo assim um hemisfério do planeta morre de fome. O capitalismo esbanja os recursos para os concentrar nas mãos dos seus privilegiados. Enquanto metade da população da terra sofre de mal-nutrição ou carências no plano da saúde, higiene e acesso à água, uma outra metade consome o suficiente para suportar um planeta inteiro e ainda deita fora diariamente uma parte igual.

Dessa metade de privilegiados, em que nos incluímos apesar de não termos tido opção, apenas um punhado de indivíduos abocanha a riqueza gerada, vivendo na opulência obscena dos milionários a quem nenhuma fortuna satisfaz. Para que esses milhões se concentrem nas mãos de menos de 1% da população terrestre é preciso destruir os recursos comuns e apropriar-se do trabalho dos outros mais de 99%. Mesmo neste contexto, o capitalismo desperdiça milhões e milhões de trabalhadores, votando-os ao desemprego para garantir baixos custos de trabalho e a total precarização das relações laborais.

O capitalismo é desperdício. Austeridade é o eufemismo, tal como Estado Novo o era para o fascismo.




Ora, desde o princípio que a Benelux, a União do Carvão e do Aço, depois a CEE, agora UEM e a UE, são estruturas de mercados capitalistas, são tratados e acordos entre classes dominantes de diversos países que, por mero acaso, ocupam o solo europeu. Aqueles que agora dizem que a "Europa falhou", que "a Alemanha destruiu a Europa", como muito se lê por parte dos que, dizendo-se de esquerda, sempre defenderam a estrutura mais de direita que existe no continente: a União Europeia, estão na verdade, a cumprir o seu papel de sempre.

Em primeiro lugar, a "Europa" não é a "União Europeia", porquanto um corresponde a uma soma de povos e a um espaço geográfico e outro a um conjunto de tratados entre capitalistas que usurparam estados e decidiram mercados.

Em segundo lugar, aqueles que agora vêm chorar pela "europa" (que é na verdade a "União Europeia"), estão apenas a absolver-se a si próprios de terem durante décadas dado a cobertura política "de esquerda" de que o capitalismo sempre precisou para seduzir os povos da Europa com uma União de liberdade, fraternidade e amizade quando na verdade ia impondo uma União de exploração e acumulação.

A derrota do Governo grego nas negociações com a União e o Eurogrupo não é uma derrota da união europeia (a que agora essa "esquerda" chama "Europa"), antes uma vitória dessa estrutura anti-democrática. A derrota do Governo grego é o triunfo dessa União Europeia, não é o triunfo da Alemanha, não é o triunfo da França, nem de qualquer outro país: é o do capitalismo.

Vir agora chorar pela "Europa" cumpre apenas o ritual da defesa da estrutura de direita que, passo a passo, vai fazendo marchar o capitalismo sobre os povos.

Dizer que a "Europa" perdeu, ou que a "Alemanha destruiu o sonho europeu" iliba o Governo grego ante as cedências que aceitou em prol dessa "Europa";

Limpa o passado dos partidos "de esquerda" que sempre foram "europeístas" (ou seja, pró-capitalistas) porque ao invés de reconhecer que este é o projecto que sempre defenderam, afirmam estar derrotado esse "projecto" humanista e internacionalista que - como se vê - nunca existiu. Ou seja, não foram o BE, a SYRIZA, o PS, o PASOK e os seus semelhantes que andaram a mentir aos povos sobre a União Europeia, mas foi a União Europeia que, como se de repente, se converteu num feudo do grande capital;

Oculta igualmente o verdadeiro papel da União, colocando o problema no comportamento de um país ou de um ou outro líder, fazendo crer que o problema não é estrutural, mas conjuntural. Como se a União Europeia não fosse precisamente isto e como se não fosse precisamente para isto que foi criada: assegurar o aprofundamento da exploração do trabalho pelo capital, independentemente da geografia que lhe sirva de quartel-general.

Por todo o mundo - e aqui em Portugal não se vê excepção - os comentadores e fazedores de opinião, os dirigentes da "esquerda moderna", da "esquerda livre", da "esquerda de confiança", da "esquerda democrática", da "esquerda moderada", se desdobram em desculpas esfarrapadas sobre uma tal "Europa" destroçada para não assumirem as responsabilidades de terem desde o início defendido afinal uma "união europeia de regressão, opressora, sem transparência, anti-democrática e absoluta e ferozmente neo-liberal". Em nada moderna, livre, de confiança, democrática ou moderada.

Nem mesmo perante o colapso da mentira, a burguesia reconhece o falhanço do capitalismo, seja burguesia de "esquerda", seja de "direita".

aqui:http://manifesto74.blogspot.pt/2015/07/este-texto-nao-e-sobre-grecia.html#more

A água não pode ser privatizada.

sexta-feira, 10 de julho de 2015

Mário Laginha

Ao piano de Mário Laginha juntaram-se o contrabaixo de Bernardo Moreira e a guitarra portuguesa de Miguel Amaral.
"Terra Seca" é o nome do trabalho de avanço, que se situa num lugar sem fronteiras, o que resulta da identidade de cada instrumento integrado num diálogo novo: em Trio.


terça-feira, 7 de julho de 2015

Por trás da dívida Grega

por Thierry Meyssan

 O debate actual sobre a dívida grega deu lugar a todo o tipo de ameaças, primeiro contra o governo Tsípras, depois contra os eleitores gregos. Abstendo-se de entrar numa discussão sobre a parte odiosa desta dívida, Thierry Meyssan analisa a campanha internacional contra a saída da Grécia da zona euro. Ele lança luz sobre o projecto histórico da União e do euro, tal como foi formulado, em 1946, por Churchill e Truman, para acabar por concluir que a Grécia está hoje em dia armadilhada pelo ambiente geo-político internacional e não pela sua situação económica.


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Joseph Retinger, ex-fascista polaco(polonês-br) tornado agente britânico. Por ordem do MI6, fundou a European League for Economic Cooperation (Liga Europeia para a Cooperação Económica- ndT) da qual se tornou o secretário-geral. Nesta qualidade, ele foi o pai do euro. Em seguida, animou o Movimento europeu e criou o Clube de Bilderberg.
O referendo grego levou a debates acalorados na União Europeia que ilustram a ignorância geral sobre as regras do jogo. Os participantes estão divididos quanto a saber se os gregos foram ou não responsáveis pela sua dívida, velando sempre para jamais acusar os seus credores de usura. Mas fizeram-no ignorando, a este respeito, a história do euro e os motivos da sua criação.

 

O euro : um projecto anglo-saxónico da Guerra Fria


Desde o Tratado de Roma, há 64 anos, as sucessivas instâncias administrativas do «projecto europeu» (CECA, CEE, UE) gastaram somas colossais, e sem equivalente, para financiar a sua propaganda nos média (mídia-br). Diáriamente centenas de artigos, emissões de rádio e de televisão, são pagos por Bruxelas para nos contar uma falsa versão da sua história e nos fazer crer que o actual «projecto europeu» é o dos Europeus de entre-as-guerras.

Ora, os arquivos estão, no entanto, agora, acessíveis a todos. Eles mostram que, em 1946, Winston Churchill e Harry Truman decidiram dividir o continente europeu em dois: de um lado os seus vassalos, do outro a URSS e os dela. Para garantir que nenhum estado se desviaria da sua suserania, eles decidiram manipular os ideais da sua época.

O que se chamava então o «projecto europeu» não consistia em defender pretensos valores comuns, mas, sim, em fundir a exploração de matérias-primas e as indústrias da Defesa da França e da Alemanha, a fim de ter a certeza que estes países não poderiam mais fazer a guerra entre si (teoria de Louis Loucheur e do conde Richard de Coudenhove-Kalergi [1]). Não se tratava de negar as profundas diferenças ideológicas, mas de se assegurar que eles não se confrontariam mais pela força.
O MI6 britânico e a CIA norte-americana foram, então, encarregados de organizar o primeiro «Congresso da Europa», em Haia, em Maio de 1948, no qual participaram 750 personalidades (entre as quais François Mitterrand) de 16 países. Tratava-se, nem mais nem menos, do que ressuscitar o «projecto da Europa federal» (redigido por Walter Hallstein –-o futuro presidente da Comissão Europeia--- para o chanceler Adolf Hitler) com base na retórica de Coudenhove-Kalergi.

Várias ideias falsas devem ser corrigidas em relação a este Congresso.
- Em primeiro lugar, convêm recolocá-lo no seu contexto. Os Estados Unidos e o Reino Unido acabavam de declarar a Guerra fria à URSS. Esta replicou apoiando os comunistas checos, que conseguiram legalmente apoderar-se do poder durante o «Golpe de Praga» («Fevereiro Vitorioso», segundo a historiografia soviética). Washington e Londres montaram então o Tratado de Bruxelas que prefigura a criação da Otan. Todos os participantes no Congresso da Europa eram pró Anglo-Saxónicos e anti-Soviéticos.
- Em segundo lugar, quando Winston Churchill pronunciou o seu discurso, ele empregou o termo «Europeu» para designar os habitantes do continente europeu (mas não os do Reino-Unido que, segundo ele, não eram Europeus) que se afirmavam anti-comunistas. Fora de questão para Churchill, à época, que Londres aderisse à União Europeia, mas apenas que a supervisionasse.
- Em terceiro lugar, duas tendências vieram à tona no Congresso: os «unionistas», para os quais se tratava, unicamente, de juntar os meios para resistir à expansão do comunismo, e os «federalistas» que desejavam concretizar o projecto nazi de Estado federal, colocado sob a autoridade de uma administração não-eleita.

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Walter Hallstein, um alto funcionário alemão, redigiu o projecto hitleriano de Europa federal. Tratava-se de destruir os Estados europeus e de federar as populações, por etnias, em torno do Reich ariano. O conjunto teria sido submetido à ditadura de uma burocracia não-eleita, controlada por Berlim. Após a Libertação, ele pôs em marcha o seu projecto com a ajuda dos Anglo-Saxões, e, tornou-se, em 1958, o primeiro presidente da Comissão europeia. 
 
O Congresso catalogou tudo o que foi alcançado depois com os nomes sucessivos de CECA (Comunidade Europeia do Carvão e do Aço- ndT), CEE e de UE.

O Congresso adoptou o princípio de uma moeda comum. Mas o MI6 e a CIA tinham já fundado a Liga Independente para a Cooperação Europeia (Independent League for European Cooperation —ILEC) [2]—tornada Liga Europeia para a Cooperação Económica (European League for Economic Cooperation—ELEC) -. O seu objectivo era, uma vez criadas as instituições da União, passar da moeda comum (a futura Unidade de Divisa Europeia - ECU) para uma moeda única (o Euro), de tal modo que os países aderentes à União nunca mais a pudessem deixar [3].

Foi este projeto que François Mitterrand concretizou em 1992. À luz da história e da participação de François Mitterrand no Congresso de Haia, em 1948, é absurdo afirmar, hoje em dia, que o euro tenha tido uma outra finalidade. É por isso que, logicamente, os Tratados actuais não prevêem a saída do euro, forçando a Grécia, se assim o desejar, a ter de sair primeiro da União para poder sair do euro.

 

O deslizar do «projecto europeu» para o sistema norte-americano


A União conheceu dois desenvolvimentos principais:
- No final dos anos 60, o Reino Unido recusou participar na guerra do Vietname, e, retirou as suas tropas do Golfo Pérsico e da Ásia. Os Britânicos deixaram de se considerar, então, como fazendo parte do 51º Estado dos Estados Unidos e de invocar a sua «relação especial» com Washington. Decidiram, então, aderir à União (1973).
- Aquando da dissolução da URSS, os Estados Unidos ficaram como únicos mestres do jogo, o Reino Unido colaborando, e os outros Estados obedecendo-lhes. Por conseguinte, a União, jamais decidiu o seu alargamento a Leste, simplesmente limitou-se a validar uma decisão tomada por Washington, e anunciada pelo seu secretário de Estado James Baker. Do mesmo modo, ela adoptou, também, tanto a estratégia militar dos Estados Unidos [4] como o seu modelo económico e social, caracterizado por enormíssimas desigualdades.

O referendo grego fez surgir uma linha de fractura entre, por um lado, as elites europeias, que se acham com a vida cada vez mais facilitada e apoiam, sem reservas, o «projecto europeu» e, por outro, as classes trabalhadoras que sofrem com este sistema e o rejeitam; um fenómeno que já se havia expresso, ainda que só à escala nacional, aquando da ratificação do Tratado de Maastricht na Dinamarca e na França, em 1992.

Num primeiro momento, os líderes europeus questionaram a validade do referendo democrático. O Secretário-geral do Conselho da Europa, Thorbjørn Jagland (o mesmo personagem que foi demitido do júri do prémio Nobel por corrupção [5]) declarou :
- que a duração da campanha era muito curta (10 dias em lugar de 14) ;
- que não poderia ser supervisionado pelas organizações internacionais (por habitualmente demorar muito tempo a organizar a supervisão),
- e que a pergunta colocada não era nem clara nem compreensível (quando a proposta da União publicada no Jornal oficial ser muito mais curta e simples que os Tratados europeus que foram submetidos a referendo).
Entretanto, a polémica deu grandíssimo brado após o Conselho de Estado grego, chamado à pronúncia por particulares sobre estes três pontos, ter validado a legalidade desta consulta.
A imprensa corporativa afirmou, então, que com o voto no «Não» a economia grega estaria dando um salto para o desconhecido.

Ora, o facto de pertencer à zona euro não é uma garantia de sucesso económico. Se alguém se refere à lista de produto interno bruto do FMI (PIB), em paridade de poder aquisitivo (PPA), apenas um Estado membro da U.E. se encontra entre os 10 primeiros do mundo: o paraíso fiscal conhecido como Luxemburgo. A França figura apenas na 25ª posição entre 193.
A taxa de crescimento da União Europeia era de 1,2% em 2014, o que a coloca no 173º posto mundial, quer dizer um dos piores resultados no mundo (a taxa média mundial está em 2,2 %).
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Mario Draghi, presidente do Banco central europeu, foi o antigo vice-presidente do banco Goldman-Sachs para a Europa. Ele mascarou, no Parlamento europeu, o seu próprio papel nas desastrosas operações financeiras realizadas pelo banco por conta do governo grego, claramente atestadas pela documentação do banco.
É forçoso constatar que pertencer à União e utilizar o euro não são garantias de êxito. Mas, se as elites europeias apoiam este «projecto» é porque ele lhes é rentável. Com efeito, tendo criado um mercado único, e uma moeda única, os Unionistas esconderam as cartas do jogo. Agora, as diferenças não são mais entre os Estados-membros, mas, sim, entre as classes sociais, que estão a ser uniformizadas à escala europeia. É por isso que os mais ricos defendem a União, enquanto os mais pobres aspiram pelo regresso de Estados membros com soberania.

 

Os contra-sensos a propósito da União e do euro


Há muitos anos que o debate é falsificado pelo vocabulário oficial : já não são os Europeus que são os portadores da cultura europeia, mas, unicamente, os membros da União. Assim é que, desde o fim da Guerra Fria, afirmam que o Russos não seriam Europeus, e, agora, que, saindo da União, a Grécia deixaria a cultura europeia da qual, na realidade, ela é o berço.
Mas, o que é claro, como diz o ditado popular em França, é que «os cães não dão gatos». A União foi concebida pelos Anglo-Saxões, com apoio de antigos nazis, contra a URSS. Ela apoia actualmente o governo ucraniano, nazis incluídos, e declarou a guerra económica à Rússia pintando-a sob o nome de «sanções».

Ao contrário do que o seu nome pretende, a União não foi criada para unir o continente europeu, mas, antes, para dividi-lo, afastando definitivamente a Rússia. Fora isto o que Charles De Gaulle denunciara, tendo-se batido, ele, por uma Europa «de Brest a Vladivostoque».
Os Unionistas garantem que o «projecto europeu» permitiu a paz na Europa durante 65 anos. Mas, falam eles da pertença à União ou da sua vassalagem aos E.U? Na realidade, foi essa que garantiu a paz entre os Estados da Europa Ocidental, ao mesmo tempo mantendo a sua rivalidade fora da zona da Otan. Será preciso lembrar, por exemplo, que os membros da União Europeia apoiaram diferentes campos na ex-Jugoslávia antes de se unificarem atrás (da bandeira- ndT) da Otan? E, será preciso considerar que se se tornassem soberanos(novamente), os membros da União recomeçariam certamente com querelas?

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Jean-Claude Juncker, indignou-se pelo convocação do referendo grego, que qualificou de «traição». Juncker foi forçado a demitir das suas funções de Primeiro-ministro do Luxemburgo quando se provou a sua pertença à rede de espionagem Gládio, da Aliança Atlântica. Um ano depois… ele tornava-se presidente da Comissão Europeia.

Para voltar ao caso grego, os peritos demonstraram, amplamente, que esta dívida é imputável quer tanto a problemas nacionais, não resolvidos desde o fim do Império Otomano, como a uma escroqueria de grandes bancos privados e de dirigentes políticos. Além disso, esta dívida é tão impagável como o são, igualmente, as dívidas dos principais Países desenvolvidos [6]. Seja como for, Atenas poderia facilmente livrar-se disto recusando, para isso, pagar a parte odiosa da sua dívida [7], deixando a União, e aliando-se com a Rússia, que é para ela um parceiro histórico e cultural muito mais sério que a burocracia Bruxelense. A vontade de Moscovo (Moscou-br) e de Pequim de investir na Grécia e de aí criar novas instituições internacionais é um segredo de polichinelo. No entanto, a situação da Grécia é tanto mais complexa quanto ela é, igualmente, país-membro da Otan, e, que a Aliança aí montou um golpe de Estado militar, em 1967, para a impedir que ela se reaproximasse da URSS [8].
Tradução
Alva


[1] « Histoire secrète de l’Union européenne » (Fr- «História secreta da União Europeia»- ndT), por Thierry Meyssan, Réseau Voltaire, 28 juin 2004.
[2] A secção francesa toma o nome de Liga Europeia de Cooperação Económica (LECE). Ela foi presidida por Edmond Giscard d’Estaing, pai do futuro presidente da República e criador do ECU.
[3] MI6 : Inside the Covert World of Her Majesty’s Secret Intelligence Service (Ing- «MI6 : Por dentro do Mundo Secreto do Serviço de Inteligência de Sua Majestade»- ndT), Stephen Dorril, The Free Press, 2000.
[4] «Stratégie européenne de sécurité» (Fr- « A Estratégia de Segurança Europeia»- ndT), Réseau Voltaire, 12 de dezembro de 2003.
[5] “Thorbjørn Jagland afastado do cargo de Presidente do Nobel da Paz”, Tradução Alva, Rede Voltaire, 13 de Março de 2015.
[6] « Selon la BRI, la dette des États développés est insolvable » (Fr- «Segundo o BRI, a dívida dos Estados desenvolvidos é insolvível»- ndT), Réseau Voltaire, 13 avril 2010.
[7] Cf. a teoria económica de Alexander Sack.
[8] «La guerre secrète en Grèce» (Fr- «A guerra secreta na Grécia»- ndT), por Daniele Ganser ; «Grèce, le facteur Otan» (Fr- «Grécia, o factor Otan»- ndT), por Manlio Dinucci, Traduction Marie-Ange Patrizio, Il Manifesto (Italie), Réseau Voltaire, 24 août 2013 et 7 avril 2015.

aqui:http://www.voltairenet.org/article188081.html

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