domingo, 30 de junho de 2013

A Democracia e os Mercados na Nova Ordem Mundial - Excertos 2

"Os principais factores que conduziram à actual crise económica global estão razoavelmente bem entendidos. Um deles é a globalização da produção que veio oferecer aos empresários a tentadora perspectiva de fazer retroceder as vitórias dos trabalhadores no plano dos direitos humanos. A imprensa de negócios avisa abertamente «os mimados trabalhadores ocidentais» de que têm de abandonar «o seu estilo de vida luxuoso» e «os factores de rigidez do mercado» que são a sagurança de emprego, as pensões, a saúde e a segurança no trabalho e outras asneiras ultrapassadas."

"A ameaça é suficiente para forçar os trabalhadores a aceitarem salários mais baixos, horarios mais longos, reduções nos beneficios e na segurança, e outras formas semelhantes de inflexibilidade."
E, ao mesmo tempo que o rendimento familiar médio continua a declinar, mesmo com a lenta recuperação a que se assiste, a revista Fortune esfrega as mãos de contente com os «deslumbrantes» lucros das 500 maiores fortunas, apesar da «estagnação» das respectivas vendas. A verdade destes «tempos das vacas magras» é que o país está a nadar em capital... mas colocado nas mãos certas."

"Um segundo factor da actual catástrofe do capitalismo de Estado, que deixou cerca de um terço da população mundial praticamente sem meios de subsistência, é a enorme explosão do capital financeiro não regulamentado, que começou há vinte anos com o desmantelamento do Sistema Bretton Woods, tendo-se chegado a uma situação em que possivelmente se movimenta todos os dias um trilião de dolares.
A estrutura do capital financeiro também mudou radicalmente. Antes de o sistema ter sido desmantelado por Richard Nixon, cerca de 90% do capital envolvido nas trocas internacionais destinava-se a investimentos e comércio, e 10% era aplicado em especulação. Em 1990 estes números tinham-se já invertido completamente e um relatório da UNCTAD estima em 95% a parte actualmente dedicada à especulação."


"A Democracia e os Mercados na Nova Ordem Mundial" - (Noam Chomski, 1994)

A Democracia e os Mercados na Nova Ordem Mundial - Excertos 1

"O historiador económico Paul Bairoch faz notar que a «moderna escola do pensamento proteccionista (...) nasceu de facto nos Estados Unidos» que constituíram «o país mãe e o bastião do proteccionismo moderno». Mas também não foram apenas os Estados Unidos. Antes de nós, a Grã-Bretanha, seguira já um caminho semelhante, tendo-se virado para o comércio livre apenas depois de cento e cinquenta anos de proteccionismo lhe terem dado tamanhas vantagens que um «campo de jogo nivelado» pareceu ser uma aposta segura, mas abandonando essa opção táctica quando a expectativa já não era satisfeita."

"Desde a Segunda Guerra, o sistema do Pentagono - incluindo a NASA e o Departamento de Energia - tem vindo a ser usado como mecanismo primordial para canalizar subsídios públicos para sectores avançados da indústria."

"A chamada «Guerra das Estrelas» foi vendida à opinião pública como um programa de «defesa» e à comunidade empresarial como subsídio público à tecnologia de ponta.
Se as forças de mercado tivessem podido funcionar livremente não haveria hoje indústria do aço ou indústria automóvel norte-americana."

"Na era Reagan, o Pentagono ajudou igualmente o sector da computação avançada a tornar-se «uma força chave de mercado», nas palavras da revista Science «promovendo a transferencia em massa de tarefas de computação dos laboratorios para uma indústria nascente» ajudando assim a criar muitas «jovens companhias de super computadores»."

"Antes da Segunda Guerra a Boeing praticamente não tinha lucros. A empresa cresceu durante a guerra graças a um aumento gigantesco de investimentos, mais de 90%  dos quais foram da responsabilidade do Governo Federal dos Estados Unidos. Os lucros dispararam igualmente uma vez que a Boeing ampliou em cinco vezes o valor da sua rede de empresas, cumprindo o seu dever patriotico."

"Num estudo  sobre o sistema do Pentagono do pós-guerra, Frank Kofski faz notar que «a fenomenal história financeira» da Boeing nos anos imediatamente subsequentes continuou a basear-se na generosidade dos contribuintes, que «permitiu aos donos das companhias aéreas arrecadar lucros fantásticos com um investimento minímo da sua parte»."

"E a história continua. No inicio dos anos 80, a «maior parte dos lucros» da Boeing dependia dos negócios no sector militar, e depois de um declinio entre 1989 e 1991, a divisão espacial e de defesa da companhia registou «uma espectacular viragem», segundo o Wall Street Journal.
Uma das causas reside na grande vaga de vendas do sector militar ao estrangeiro, uma vez que os Estados Unidos se tornaram no maior vendedor de armas do mundo, dominando quase três quartos do mercado do Terceiro Mundo, sempre com ampla intervenção governamental e subsídios públicos para aplanar caminho."

"A ideia de que a indústria não pode sobreviver numa «economia de  livre empreendimento» estendeu-se para lá do sector da aviação. A seguir à guerra, a questão prática era a de saber que forma deveria o subsídio público adoptar. Aqueles que se encontravam à frente dos grandes negócios sabiam que os gastos sociais podiam estimular a economia, mas preferiram a alternativa militar, por razões que tinham a ver com privilégios e poder e não por motivos de «racionalidade economica»."

"A Democracia e os Mercados na Nova Ordem Mundial" - (Noam Chomski 1994)

Declaração após um ano na Embaixada do Equador


 por Julian Assange

Já se passou um ano desde que cheguei a esta Embaixada em busca de refúgio à perseguição.

Em consequência dessa decisão, pude trabalhar relativamente a salvo da espionagem estado-unidense.

Mas hoje, o calvário de Edward Snowden acaba de começar.

Dois processos perigosos e fora de controle instalaram-se na última década, com consequências fatais para a democracia.

O segredo de Estado propagou-se a uma escala aterradora.

Simultaneamente, a privacidade humana foi secretamente erradicada.

Algumas semanas atrás, Edward Snowden revelou a existência de um programa em execução – que envolve a administração Obama, a comunidade de inteligência e as maiores corporações de serviços da Internet – destinado a espiar o mundo inteiro.

Automaticamente foram-lhe atribuídas pela administração Obama acusações de espionagem.

O governo dos Estados Unidos espia todos e cada um de nós, mas é Edward Snowden que é acusado de espionagem, por nos haver alertado.

Estamos a chegar ao ponto em que a marca de distinção internacional e de serviço à humanidade já não é mais o Prémio Nobel da Paz mas sim uma acusação de espionagem por parte do Departamento da Justiça dos EUA.

Edward Snowden é o oitavo denunciante acusado de espionagem sob a administração deste presidente.

O julgamento mediático de Bradley Manning entra na sua quarta semana esta segunda-feira.

Depois de uma sucessão de injustiças contra ele cometidas, o governo dos Estados Unidos está a tentar declará-lo culpável de "colaborar com o inimigo".

A palavra "traidor" tem sido muito utilizada ultimamente.

Mas quem é realmente o traidor aqui?

Quem foi que prometeu a uma geração "esperança" e "mudança", só para trair aquelas promessas com lúgubre miséria e estagnação?

Quem jurou defender a Constituição dos Estados Unidos, só para a seguir alimentar a besta invisível das leis secretas que a devora viva a partir de dentro?

Quem prometeu presidir "a administração mais transparente da História", só para esmagar um denunciante após o outro sob o peso das acusações de espionagem?

Que combinou no seu executivo os poderes de juiz, jurado e executor, reivindicando todo o planeta como sua jurisdição para exercer esses poderes?

Quem se arroga o poder de espiar o planeta inteiro – cada um de nós – e quando é apanhado em flagrante nos explica que "vamos ter de escolher"?

Quem é essa pessoa?

Sejamos muito cuidadosos acerca de quem chamamos "traidor".

Edward Snowden é um dos nossos.

São jovens com formação técnica que pertencem à geração traída por Barack Obama.

São a geração que cresceu com a Internet e que foi por ela formada.

O governo estado-unidense sempre vai precisar analistas de inteligência e administradores de sistema e vai ter de contratá-los entre os membros desta geração e das que se seguirão.

Um dia, esta geração dirigirá a NSA, a CIA e o FBI.

Não se trata de um fenómeno que vá desaparecer.

Trata-se de algo inevitável.

Ao tentar destruir estes jovens que nos alertam, acusando-os de espionagem, o governo dos Estados Unidos está a enfrentar toda uma geração e essa é uma batalha que vai perder.

Isto não é o modo de consertar as coisas.

A única maneira de consertá-las é esta:

Mudem as políticas.

Deixem de espionar o mundo.

Eliminem as leis secretas.

Cessem as detenções por tempo indefinido e sem julgamento.

Deixem de assassinar pessoas.

Deixem de invadir outros países e de enviar jovens estado-unidenses para matar e morrer.

Parem as ocupações e acabem com as guerras secretas.

Deixem de devorar os jovens: Edward Snowden, Barrett Brown, Jeremy Hammond, Aaron Swartz, Gottfrid Svartholm, Jacob Appelbaum e Bradley Manning.

As acusações contra Edward Snowden pretendem intimidar qualquer país que possa estar a considerar levantar-se pelos seus direitos.

Não se pode permitir que essa táctica funcione.

O esforço a fim de encontrar asilo para Edward Snowden deve ser intensificado.

Qual será o corajoso país que se erguerá em favor dele e reconhecerá o serviço que prestou à humanidade?

Digam aos seus governos para darem um passo em frente.

Avancem e apoiem Snowden.
22/Junho/2013
O original encontra-se em http://wikileaks.org/Statement-by-Julian-Assange-after,249.html

Esta declaração encontra-se em http://resistir.info/


http://resistir.info/varios/assange_22jun13.html 

Desinformação Jornalística - Rede Globo


sábado, 29 de junho de 2013

Os limites do pânico

 Muitas vezes ouvimos falar que o mundo, tal e como o conhecemos, um dia terminará, em geral como consequência de um colapso ecológico. De fato, mais de 40 anos depois que o Clube de Roma difundiu a mãe de todos os prognósticos apocalípticos, Os Limites do Crescimento, suas ideias básicas seguem vigentes. Mas o tempo não tem sido ameno.

Os Limites do Crescimento advertiam a humanidade em 1972 que um colapso devastador estava a ponto de ocorrer. Mas, se bem temos visto pânicos financeiros desde então, não foram registradas nem escassez nem colapsos produtivos reais. Mais bem, os recursos gerados pela engenhosidade humana seguem tirando muita vantagem do consumo humano.

No entanto, o legado fundamental do informe segue de pé: herdamos uma tendência a nos obcecarmos pelos remédios equivocados para os problemas essencialmente triviais, enquanto costumamos ignorar os grandes problemas e os remédios apropriados.

No começo dos anos 1970, a enxurrada de otimismo tecnológico se acabou, a guerra do Vietnam foi um desastre, as sociedades estavam em estado de agitação e as economias se estancavam. O livro de 1962 de Rachel Carson, Primavera Silenciosa, gerou temores sobre a contaminação e deu origem ao movimento ambientalista moderno; o título do livro de 1968 de Paul Ehrlich, A Bomba Demográfica, dizia tudo. O primeiro Dia da Terra, em 1970, foi profundamente pessimista.

A genialidade de Os Limites do Crescimento foi fundir esses temores com o medo de ficarmos sem recursos. Estávamos condenados, porque demasiadas pessoas consumiriam demais. Ainda se nossa engenhosidade nos servisse para ganhar tempo, com a contaminação terminaríamos matando o planeta e a nós mesmos. A única esperança era frear o crescimento econômico, reduzir o consumo, reciclar e obrigar as pessoas a terem menos filhos, estabilizando a sociedade em um nível significativamente mais pobre.

Hoje ainda segue ressoando esta mensagem, ainda que fosse espetacularmente errada. Por exemplo, os autores de Os Limites do Crescimento previram que antes de 2013, o mundo haveria ficado sem alumínio, cobre, ouro, chumbo, mercúrio, molibdênio, gás natural, petróleo, prata, folha de flandres, tungstênio e zinco.

Pelo contrário, e apesar dos incrementos recentes, os preços das matérias primas em termos gerais caíram a aproximadamente um terço de seu valor equivalente há 150 anos. As inovações tecnológicas substituíram o mercúrio nas baterias, nas obturações dentárias e nos termômetros: o consumo de mercúrio reduziu-se 98% e, no ano 2000, o preço havia caído 90%. Em termos mais amplos, desde 1946, a oferta de cobre, alumínio, ferro e zinco sobrepassou o consumo, devido à descoberta de reservas adicionais e novas tecnologias para extraí-los a menor custo.

Da mesma maneira, o petróleo e o gás natural iriam acabar em 1990 e 1992, respectivamente; hoje, as reservas de ambos são maiores que em 1970, ainda que se consuma muitíssimo mais. Nos últimos seis anos, só o gás de folhelho duplicou os recursos potenciais de gás natural nos Estados Unidos e reduziu o preço à metade.

No que se refere ao colapso econômico, o IPCC estima que o PIB global per capita aumente 14 vezes neste Século e 24 vezes nos países em desenvolvimento.

Os Limites do Crescimento se equivocou tanto porque seus autores passaram por cima e ignoraram o maior recurso de todos: a nossa própria iniciativa. O crescimento demográfico foi se desacelerando desde finais dos anos 1960. A oferta de alimentos não se colapsou (estamos utilizando 1.500 milhões de hectares de terras aráveis, mas há outros 2.700 milhões de hectares de reserva). A desnutrição caiu mais da metade, de 35% da população mundial a menos de 16%.

Tampouco estamos nos engasgando com contaminações. Embora o Clube de Roma imaginasse um passado idílico sem nenhuma contaminação particular do ar e agricultores felizes, e um futuro afogado por chaminés em erupção, a realidade é absolutamente oposta.

Em 1900, quando a população humana global era de 1,5 bilhões de habitantes, quase três milhões de pessoas – aproximadamente 1 de cada 500 – morria a cada ano por causa da contaminação ambiental, principalmente como consequência da péssima qualidade do ar em ambientes fechados. Hoje, o risco se reduziu a uma morte a cada 2.000 pessoas. Se bem que a contaminação segue matando a mais pessoas que a malária, a taxa de mortalidade está caindo, não subindo.

No entanto, a mentalidade alimentada por Os Limites do Crescimento segue dando forma ao pensamento popular e das elites.

Consideremos a reciclagem, que costuma ser apenas um gesto para sentir-se bem com escassos benefícios ambientais e um custo significativo. O papel, por exemplo, costuma vir de bosques sustentáveis, não de florestas tropicais. O processamento e os subsídios governamentais associados com a reciclagem geram um papel de menor qualidade para salvar um recurso que não está em perigo.

Da mesma maneira, os medos a uma população excessiva foram o marco de políticas autodestrutivas, como a política de um só filho da China e a esterilização compulsória na Índia. E, embora se tenha determinado que os pesticidas e outros agentes contaminantes possam ser a causa da morte de talvez a metade da população, os pesticidas bem regulados ocasionam ao redor de 20 mortes a cada ano nos Estados Unidos, enquanto que têm vantagens importantes na produção de alimentos mais econômicos e mais abundantes.

Por certo, a dependência exclusivamente da agricultura orgânica – um movimento inspirado pelo medo aos pesticidas – custaria mais de 100 bilhões de dólares anualmente nos Estados Unidos. Com uma eficiência inferior a 16%, a produção atual requereria outros 27 milhões de hectares de terras aráveis – uma superfície de mais da metade da Califórnia. Os preços mais elevados reduziriam o consumo de frutas e verduras, causando uma infinidade de efeitos adversos para a saúde (entre eles, dezenas de milhares de mortes adicionais por câncer a cada ano).

A obseção pelos cenários pessimistas nos distrai das verdadeiras ameaças globais. A pobreza é um dos maiores assassinos, e as enfermidades facilmente curáveis seguem cobrando 15 milhões de vidas todos os anos – 25% de todas as mortes.

A solução é o crescimento econômico. Quando saem da pobreza, a maioria das pessoas não sucumbe às enfermidades infecciosas. A China já tirou mais de 680 milhões de pessoas da pobreza nas últimas três décadas, liderando uma redução da pobreza a nível mundial de quase 1 bilhão de pessoas. Isso criou sólidas melhorias na saúde, na longevidade e na qualidade de vida.

As quatro décadas transcorridas desde Os Limites do Crescimento demonstraram que necessitamos mais, e não menos crescimento. Uma expansão do comércio, com benefícios estimados que poderiam super os 100 bilhões de dólares anuais até finais do Século, seria milhares de vezes mais benéfica que as tímidas políticas para fazer-nos sentir bem que resultam do alarmismo. Mas isso requer abandonar uma mentalidade anticrescimento e utilizar nosso enorme potencial para criar um futuro mais brilhante.
O texto acima é uma tradução livre de um artigo de Bjørn Lomborg publicado em Project Syndicate. Para ver o original, clique aqui

http://agfdag.wordpress.com/2013/06/26/os-limites-do-panico/

quinta-feira, 27 de junho de 2013

Capitalismo, democracia e eleições


por Richard D. Wolff [*]
Eleições à moda dos EUA. Capitalismo e democracia real nunca tiveram muito a ver um com o outro. Em contrapartida, a votação formal em eleições tem funcionado lindamente para o capitalismo. Afinal de contas, eleições raramente puseram em causa, muito menos decidiram, a questão do capitalismo: se os eleitores preferem isto ou um sistema económico alternativo. Os capitalistas têm mantido com êxito as eleições centradas alhures, sobre questões e opções não sistémicas. Este êxito permitiu-lhes em primeiro lugar igualar democracia a eleições e a seguir celebrar eleições em países capitalistas como prova da sua democracia. Naturalmente, eleições imparciais foram e são permitidas apenas fora das empresas capitalistas. Eleições democráticas dentro delas – onde os empregados são maioria – nunca acontecem.

Democracia real significa que importantes decisões que afectam as vidas das pessoas são tomadas genuinamente e igualmente pelas pessoas afectadas. A organização capitalista das empresas portanto contradiz a democracia real. No interior das corporações que dominam o capitalismo moderno, uma minúscula minoria – os accionistas principais e os conselhos de administram que eles elegem – tomam decisões chave que afectam os que estão abaixo deles na hierarquia corporativa, os empregados. Aquela pequena minoria decide que produtos a corporação produzirá, que tecnologias serão utilizadas, onde ocorrerá a produção e como serão distribuídas as receitas líquidas da corporação. A maioria é afectada, muitas vezes profundamente, por todas essas decisões, mas não participa na elaboração delas.

Dentro das modernas corporações capitalistas típicas, a democracia real (assim como a eleitoral) está excluída. Sociedades que celebram o compromisso com a democracia e justificam políticas do governo (incluindo guerras) como promotoras da democracia também excluem a democracia dos seus lugares de trabalho. Esta contradição absoluta provoca graves problemas. Conscientemente ou inconscientemente, os trabalhadores percebem, sentem e exprimem insatisfações que reflectem essa contradição.

Exemplo: os trabalhadores percebem o desrespeito que baixa das alturas do comando das corporações. Frequentemente sentem que suas capacidades e criatividades não são reconhecidas, não são utilizadas e/ou são desvalorizadas. Expressões de tais sentimentos incluem absenteísmo, tensões inter-pessoais e disfunções relacionadas com o trabalho (alcoolismo, insubordinação, furto, etc). A exclusão da democracia dos lugares de trabalho muitas vezes provoca ressentimentos dos trabalhadores e resistências que reduzem a produtividade e os lucros. As corporações desde há muito respondem com a contratação de múltiplas camadas de supervisores custosos no lugar de trabalho e proporcionando grandes orçamentos para eles. Aquelas despesas corporativas estão entre os custos que o capitalismo desperdiça: somas desviadas do investimento, do crescimento económico, do progresso técnico e de outras utilizações sociais preferíveis.

As eleições fora do lugar de trabalho mantêm-se numa relação ambivalente com a exclusão de democracia real interna do capitalismo. Por um lado, eleições distraem o povo das suas inquietações conscientes e inconscientes com as condições de trabalho. As eleições centram-se, ao invés, em candidatos políticos, partidos e políticas alternativas em torno de questões diferentes do que capitalismo versus sistemas económicos alternativas e diferentes também das suas respectivas condições de trabalho. Eis porque os apoiantes do capitalismo apreciam eleições. Eleições bem controladas não questionam, e muito menos ameaçam, o capitalismo. Por outro lado, elas sempre contém um risco, o potencial causar grandes problemas ao capitalismo.

Os trabalhadores a quem é negada democracia no emprego podem concluir que problemas tão cruciais como salários inadequados, segurança de emprego e benefícios e estão conscientes desta negação. Dada a enaltecida equivalência do capitalismo entre democracia e eleições, os trabalhadores podem voltar-se para eleições como um meio de responder à ausência de democracia no lugar de trabalho. Sabendo que eles incluem a maioria eleitoral, os trabalhadores podem encarar eleições como o meio para mudar as suas condições económicas. A política eleitoral poderá tornar-se o seu caminho para desfazer as consequências de um sistema económico capitalista. A maioria podia por em causa, numa decisão eleitoral, a escolha entre a organização capitalista e a democrática no local de trabalho. Os trabalhadores poderiam utilizar eleições fora das empresas para finalmente trazer eleições e democracia real para dentro delas. A política convencional deixa aquela possibilidade em aberto, um risco perpétuo para capitalistas ansiosos.

Dentre as soluções encontradas para este problema, capitalistas financiam candidatos e partidos nas campanhas eleitorais e entre elas. Em contrapartida, responsáveis eleitos apoiam desejos dos seus financiadores, especialmente quanto ao que é o que não é apresentado aos eleitores para decidir. Empresas capitalistas também financiam think tanks, programas académicos, mass media e campanhas de relações públicas que moldam a opinião pública em favor do capitalismo. No último meio século emergiu ainda outra solução: manter o estado na defensiva não só ideologicamente como também financeiramente por meio de défices orçamentais e dívidas.

Exemplo (obrigado a Doug Korty por este apontamento): os défices totais do governo federal [dos EUA] de 1950 a 2009 foram de US$6,6 milhões de milhões (trillion). Durante aqueles anos, três presidentes republicanos (Bush1, Reagan e Bush 2) foram responsáveis por mais de 92% daqueles défices. Todos os outros presidentes (Truman, Eisenhower, Kennedy, Johnson, Nixon/Ford, Carter e Clinton) somados foram responsáveis por 12%. Os três presidentes republicanos felizes com défices foram os mais conservadores e subservientes aos principais interesses capitalistas. Todos eles aumentaram os gastos (principalmente para actividade militar e objectivos de contenção de crise) enquanto cortavam impostos (especialmente para corporações e os indivíduos mais ricos). Tais políticas obrigaram a enormes défices federais e a subidas rápidas da dívida nacional. Pelo seu enorme estímulo ao gasto e às guerras custosas não compensadas por aumentos de impostos, a administração Obama também incide em défices muito grandes e ascende a dívida nacional.

Seguem-se as previsíveis tempestades ideológicas: (1) défices e dívidas federais foram definidos como os problemas urgentes; e (2) programas de austeridade para cortar despesas do governo eram a solução apropriada. Republicanos e democratas desempenharam os seus papéis previsíveis argumentando sobre o ritmo, dimensão e objectivos da austeridade. Todos os seus argumentos mantêm a questão do capitalismo fora da agenda para o debate popular e político apesar da crise do sistema.

Quando soluções convencionais fracassam e cada vez mais pessoas começam a questionar, desafiar e opor-se ao capitalismo, os capitalistas geralmente apoiam a polícia e a repressão militar. Em situações extrema, eles acabam com a democracia eleitoral por meio de um golpe militar, ditadura ou qualquer outro. Contudo, acabar com a democracia eleitoral habitualmente provoca ansiedade mesmo entre os capitalistas que a apoiam. A sua preocupação é de que o fim da democracia eleitoral provoque crítica social e oposição sistémica que possa se expandir de modo a incluir um sistema de produção não democrático. Eles não desejam perder o benefício chave de eleições adequadamente controladas: distrair os trabalhadores afastando-os da questão do capitalismo em si. Tais eleições são o modo mais barato e menos perigoso para assegurar a distância que o capitalismo mantém entre ele próprio e a democracia real.
 

[*] Professor emérito da Universidade de Massachusetts – Amherst.   Seu sítio web é www.rdwolff.com .

O original encontra-se em mrzine.monthlyreview.org/2013/wolff210613.html


Este artigo encontra-se em http://resistir.info/


http://resistir.info/crise/wolff_21jun13.html 

PORTUGAL, UM POVO ESPOLIADO E SAQUEADO

Não há dinheiro? Mas o rombo fraudulento do BPN está a custar 9 mil milhões de euros ao erário público; o défice da Madeira mais 5,8 mil milhões; o escândalo dos swaps monta a 3 mil milhões; e as PPPs rodoviárias a bagatela de 9 mil milhões de euros. Só estas quatro coisas significam um prejuízo de 26,8 mil milhões de euros para o Estado português – sem falar nas muitas outras que pejam a vida pública do país. Mas não passa pela cabeça deste serviçal da troika, o governo P.Coelho/P.Portas cortar em nada disso. O que eles querem é cortar mais 4,0 a 4,8 mil milhões de euros, até 15 de Julho próximo, nas pensões de reforma e nas remunerações de funcionários públicos.
Por este governo na rua é um imperativo de sobrevivência nacional.

Todo o apoio à Greve Geral!



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The U.S. vs John Lennon - Imperdível

'The U.S. vs. John Lennon é um documentário que mostra o lado ativista de John Lennon.Nesse documentário existem imagens do músico juntando milhares de pessoas para protestar contra a Guerra do Vietnã. No documentário aparece ainda uma suposta tentativa do governo dos Estados Unidos de espionar Lennon.

quarta-feira, 26 de junho de 2013

Flexibilização= Desemprego=Pobreza

por Raquel Varela

«Sucessivos governos argumentam que se flexibiliza o mercado de trabalho para combater o desemprego. Mas, chegámos a uma conclusão, neste estudo, inequívoca: maior flexibilização do mercado de trabalho significa, olhando com detalhe e dados para as últimas 3 décadas, mais desemprego. Porque a precariedade e o desemprego são duas faces da mesma moeda – entra-se e sai-se ciclicamente da produção, de acordo com os ciclos de expansão e de lucro. E mais desemprego significa mais pobreza e menos descontos para a segurança social. 43% dos portugueses são pobres sem transferências sociais. Num parágrafo, é mais ou menos este o “estado a que chegámos”».

Raquel Varela, Historiadora, coordenadora do livro A Segurança Social é Sustentável. Trabalho. Estado e Segurança Social em Portugal (Bertrand, 2013)

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http://5dias.wordpress.com/2013/06/26/flexibilizacao-desempregopobreza/ 

Greve Geral


domingo, 23 de junho de 2013

O PRISM e a ascensão de um novo fascismo


  por John Pilger
 
Logo do PRISM. No seu livro, Propaganda, publicado em 1928, Edward Bernays escreveu: "A manipulação consciente e inteligente dos hábitos organizados e das opiniões das massas é um elemento importante na sociedade democrática. Aqueles que manipulam este mecanismo que não se vê da sociedade constituem um governo invisível, o qual é o verdadeiro poder dominante no nosso país".

Bernays, o sobrinho americano de Sigmund Freud, inventou a expressão "relações públicas" como um eufemismo para propaganda de estado. Ele advertiu uma ameaça permanente ao governo invisível era os que dizem a verdade e um público esclarecido.

Em 1971, Daniel Ellsberg trouxe a público os ficheiros do governo estado-unidense conhecidos como "The Pentagon Papers", revelando que a invasão do Vietname fora baseada numa mentira sistemática. Quatro anos depois, Frank Church dirigiu audiências sensacionais no Senado dos EUA: um dos últimos lampejos da democracia americana. Estas puseram a nu a plena extensão do governo invisível: a espionagem e subversão internas e a provocação de guerra pelas agências de inteligência e "segurança", bem como o apoio que recebiam do big business e dos media, tanto conservadores como liberais.

Ao referir-se à Agência de Segurança Nacional (NSA, na sigla em inglês), o senador Church afirmou: "Sei que a capacidade que há para instaurar tirania na América e devemos verificar que esta agência e todas as agências que possuem esta tecnologia operem dentro da lei... de modo a que nunca cruzemos esse abismo. Trata-se do abismo do qual não há retorno".

Em 11 de Junho de 2013, a seguir às revelações no Guardian de Edward Snowden, contratado pela NSA, Daniel Ellsberg escreveu que os EUA agora caíram dentro "daquele abismo".

A revelação de Snowden, de que Washington utilizou a Google, Facebook, Apple e outros gigantes da tecnologia do consumidor para espionar quase toda a gente, é uma nova evidência da forma moderna de fascismo – esse é o "abismo". Tendo nutrido fascistas tradicionais por todo o mundo – desde a América Latina à África e à Indonésia – o génio libertou-se e voltou para casa. Entender isto é tão importante quanto entender o abuso criminoso da tecnologia.

Fred Branfman, que revelou a destruição "secreta" do pequeno Laos pela US Air Force nas décadas de 1960 e 70, proporciona uma resposta àqueles que ainda se admiram como um presidente afro-americano, um professor de direito constitucional, pode comandar tamanha ilegalidade. "Sob o sr. Obama", escreveu ele, "nenhum presidente fez mais para criar a infraestrutura para um possível futuro estado policial". Por que? Porque Obama, tal como George W. Bush, entende que o seu papel não é satisfazer aqueles que nele votaram mas sim expandir "a mais poderosa instituição da história do mundo, uma instituição que matou, feriu ou privou de lar bem mais de 20 milhões de seres humanos, principalmente civis, desde 1962".

No novo ciber-poder americano, só as portas giratórias mudaram. O director da Google Ideas, Jared Cohen, era conselheiro de Condaleeza Rice, a antiga secretária de Estado na administração Bush que mentiu quando disse que Saddam Hussein podia atacar os EUA com armas nucleares. Cohen e o presidente executivo da Google, Eric Schmidt – eles encontraram-se nas ruínas do Iraque – escreveram um livro em co-autoria, The New Digital Age, apresentado como visionário pelo antigo director da CIA Michael Hayden e pelos criminosos de guerra Henry Kissinger e Tony Blair. Os autores não mencionam o programa de espionagem Prism , revelado por Edward Snowden, que proporciona à NSA acesso a todos nós que utilizamos o Google.

Controle e domínio são as duas palavras que dão o sentido disto. São exercidos através de planos políticos, económicos e militares, entre os quais a vigilância em massa é uma parte essencial, mas também pela propaganda insinuante na consciência pública. Este era o ponto de Edward Bernay. As suas duas campanhas de RP com mais êxito foram convencer os americanos que deveriam ir à guerra em 1917 e persuadir as mulheres a fumarem em público; os cigarros eram "archotes da liberdade" que acelerariam a libertação da mulher.

É na cultura popular que o "ideal" fraudulento da América como moralmente superior, como "líder do mundo livre", tem sido mais eficaz. Mas, mesmo durante os períodos mais patrioteiros de Hollywood houve filmes excepcionais, como aqueles de Stanley Kubrick no exílio e audaciosos filmes europeus que encontravam distribuidores nos EUA. Nestes dias, não há Kubrick, nem Strangelove e o mercado estado-unidense está quase fechado a filmes estrangeiros.

Quando apresentei meu filme, "A guerra à democracia" ( "The War on Democracy" ), a um grande distribuidor dos EUA de mentalidade liberal, recebi uma lista de mudanças exigidas para "assegurar que o filme fosse aceitável". A sua inesquecível cedência para mim foi: "OK, talvez pudéssemos deixar Sean Penn como narrador. Isso o satisfaria?" Ultimamente, o filme de apologia da tortura "Zero Dark Thirty", de Katherine Bigelow, e "We Steal Secrets", um trabalho de machadinha contra Julian Assange, foram feitos com o apoio generoso da Universal Studios, cuja companhia-mãe até recentemente era a General Electric. A GE fabrica armas, componentes para aviões-caça e tecnologia avançada de vigilância. A companhia também tem interesses lucrativos no Iraque "libertado".

O poder dos que contam verdades, como Bradley Manning, Julian Assange e Edward Snowde, é que eles refutam toda uma mitologia construída cuidadosamente pelo cinema corporativo, pela academia corporativo e pelos media corporativos. A WikiLeaks é especialmente perigosa porque proporciona aos que contam a verdade um meio para a por cá fora. Isto foi conseguido em "Collateral Murder", o vídeo filmado a partir da cabina de um helicóptero Apache dos EUA que alegadamente foi revelado por Bradley Manning. O impacto deste único vídeo marcou Manning e Assange para a vingança do estado. Ali estavam pilotos dos EUA a assassinar jornalistas e mutilar crianças numa rua de Bagdad, a divertirem-se claramente com isso e a descrever a sua atrocidade como "linda". Mas, num sentido vital, eles não escaparam sem punição; somos agora testemunhas e o que resta é para nos tramar.
20/Junho/2013
O original encontra-se em New Statesman e em www.counterpunch.org/2013/06/21/prism-and-the-rise-of-a-new-fascism/

Este artigo encontra-se em http://resistir.info/


http://resistir.info/pilger/pilger_20jun13.html 

O gás sarin é tão volátil como as promessas de Washington

SkyWatch Mobile Guard Towers


sexta-feira, 21 de junho de 2013

Entrevista a Raquel Varela

“A Segurança Social é sustentável” não é uma pergunta, é uma afirmação categórica, que dá nome ao último livro coordenado pela historiadora e investigadora do Instituto de História Contemporânea da Universidade Nova de Lisboa Raquel Varela.

A publicação lançada esta semana procura retratar a evolução do Trabalho, do Estado e da Segurança Social ao longo dos últimos 40 anos.

Nesta entrevista conduzida pelo jornalista José Guerreiro, Raquel Varela explica que nesta obra foi ao encontro do trabalho que vários dos seus colegas que têm uma visão crítica da Economia Política que não se conforma com uma sociedade baseada nas relações estritamente mercantis.

http://www.rtp.pt/antena1/index.php?t=Entrevista-a-Raquel-Varela.rtp&article=6653&visual=11&tm=16&headline=13

Com Bangladesh no horizonte

"A recessão na Europa persistirá até que as elites da UE alcancem o seu objetivo, que consiste em dizimar o modelo social que proporciona cuidados de saúde, pensões e proteção laboral para os 17 membros da Eurozona. É disto que se trata. Uma vez que os trabalhadores da UE tenham sido reduzidos à pobreza do terceiro mundo, então os fazedores desta política voltarão a uma estratégia pró-crescimento, mas não antes".
 

Mike Whitney [1]

 1- Back to Recession, http://www.counterpunch.org/2013/04/26/back-to-recession/ , 26/04/2013

http://resistir.info/portugal/horizonte_bangladesh.html 

“Armas de Destruição em Massa”, parte 2*

por Jorge Cadima

O imperialismo prepara a escalada de intervenção na Síria. Regressa o estafado filme das “armas de destruição em massa”, agora com o presidente e governo “socialistas” em França a desempenharem o papel que antes coube a Blair e a Bush em relação ao Iraque. A não serem detidos, às mesmas mentiras seguir-se-ão os mesmos crimes, a mesma ocupação, a mesma “destruição em massa”.


Há uma década, o imperialismo lançou uma enorme campanha de desinformação alegando que o Iraque de Saddam Hussein tinha armas de destruição em massa (ADM). Cedo se confirmou que o pretexto não passava duma Aldrabice para a Destruição em Massa (ADM). Agora, uma nova versão da saga ADM está em marcha. O seu subtítulo é «as armas químicas de Bachar al-Assad».
Actor de proa da ADM 2.0 é o presidente «socialista» francês, François Hollande, que no início deste mês foi agraciado com o Prémio da Paz da UNESCO por (pasme-se!) «a sua contribuição considerável para a paz e a estabilidade em África». Ou seja, pela invasão militar do Mali. O presidente do júri de tão criativa atribuição é Mário Soares (www.unesco.org). Após reestabelecer a ordem colonial no Mali, Hollande parece determinado em reestabelecer a ordem colonial na Síria. O seu ministro dos Negócios Estrangeiros, Laurent Fabius, declarou em entrevista que «a França já tem a certeza de que o gás sarin foi usado na Síria […]. Não há qualquer dúvida que [os responsáveis] são o regime e os seus cúmplices, porque fomos capazes de recriar toda a cadeia» do ataque (Libération, 4.6.13). E esclarece: «todas as opções estão em cima da mesa […] incluindo uma reacção armada contra os locais de armazenamento do gás». A França não tem dúvidas. Mesmo depois de Carla del Ponte ter afirmado (Independent, 6.5.13) que se alguém usou gás sarin na Síria, foram os «rebeldes» armados pelo imperialismo. Mesmo depois de «jornais turcos terem relatado que 12 membros da Frente al-Nusra da Síria, com ligações à Al-Qaeda, que alegadamente planeavam um ataque na Turquia e que estavam na posse de 2kg de sarin, tinham sido presos» naquele país (Reuters, 30.5.13). Até o insuspeito New York Times escreveu (10.6.13) que «o presidente Obama terá, sem querer, fornecido um incentivo para exagerar» relatos de utilização de armas químicas ao afirmar que «a utilização de armas químicas pelo governo Sírio seria uma ‘linha vermelha’» que provocaria uma escalada da intervenção dos EUA no conflito. Mas o Prémio Unesco da Paz parece ter convencido o Prémio Nobel da Paz que chegou a hora de fazer uma guerra a sério. Em comunicado da Casa Branca, e apesar do «governo Obama estar profundamente dividido» (NYT, 13.6.13), o vice conselheiro de segurança nacional de Obama avalizou as acusações contra o governo sírio. A máquina de guerra aquece os motores. Do infalível senador McCain, ao ex-presidente Clinton e ao inglês Cameron, cresce o coro que pede uma escalada da intervenção na Síria. E cresce a presença militar dos EUA na região – na Turquia, Israel e Jordânia.

As verdadeiras causas de tanta movimentação não são armas químicas. Nem são difíceis de encontrar, mesmo na imprensa de regime: «os rebeldes sírios estão a perder terreno na sua luta contra o governo de Bachar al-Assad» (CNN, 14.6.13) e «depois das tropas do Sr. Assad – auxiliadas por combatentes do grupo militante Hezbollah – terem conquistado a estratégica cidade de Qusayr […] Washington receia que grande parte da rebelião esteja à beira do colapso» (NYT, 13.6.13). A cruzada imperialista no Médio Oriente arrisca uma derrota de enormes consequências. Et voilá les armes chimiques! grita Fabius, «o Químico».

A farsa é grotesca, mas ameaça transformar a tragédia em catástrofe. Desde há muito que a Síria está a ser destruída por mercenários armados, pagos e apoiados pelos EUA, Inglaterra, França, Arábia Saudita, Qatar, Turquia, Jordânia (e outros). Em Maio, Israel bombardeou Damasco. A Rússia ripostou reforçando o seu apoio ao governo sírio. O Hezbollah ripostou entrando em acção no terreno. O Irão já declarou repetidamente que, caso seja necessário, entrará em acção em apoio do aliado sírio. Uma escalada da aventura militar imperialista no Médio Oriente arrisca-se a incendiar, não apenas a região, mas todo o planeta.

*Este artigo foi publicado no “Avante!” nº 2064, 20.06.2013

http://www.odiario.info/?p=2916

Ataques ao mundo do trabalho

quinta-feira, 20 de junho de 2013

Sá Carneiro e as Armas para o Irão


Não se pode compreender Camarate se não se souber que Portugal era um país importante do ponto de vista geoestratégico, onde a Base das Lajes, nos Açores, desempenhava um papel essencial para o equilíbrio militar entre os EUA, a União Soviética e o Médio Oriente. Foi necessário recordar e perceber...
Não se pode compreender Camarate se não se souber que Portugal era um país importante do ponto de vista geoestratégico, onde a Base das Lajes, nos Açores, desempenhava um papel essencial para o equilíbrio militar entre os EUA, a União Soviética e o Médio Oriente. Foi necessário recordar e perceber quem eram os personagens desta história nacional e internacional. De onde surgiram algumas figuras políticas, militares ou simples civis que se encontraram todos reunidos à volta de um interesse comum no dia 4 de Dezembro de 1980.
Quais as suas motivações. Uns moviam-se por ideais, outros pela ganância financeira ou glória pessoal. E uns poucos tentavam simplesmente sobreviver num mundo em constante mudança.

http://www.youtube.com/watch?v=eRZlClmh7JM
http://xatoo.blogspot.pt/2013/06/a-conferencia-libertar-portugal-da.html

quarta-feira, 19 de junho de 2013

Mais importante que pensar no pós-troika é impedir que a "troika" e este governo destruam ainda mais a economia e a sociedade portuguesa


por Eugénio Rosa [*]

A política recessiva pró-cíclica de cortes nos rendimentos dos trabalhadores e dos pensionistas e de enormes aumentos de impostos que está a ser aplicada em Portugal em plena recessão económica, situação esta que é agravada pela facto da maioria dos países da UE estar também em recessão, a continuar, deixará Portugal numa situação muito pior que a atual, que é já pior do que a que existia quando a “troika” e este governo entram em funções, como mostro utilizando alguns dados oficiais, apresentados sob a forma de gráfico para serem mais claros e de leitura rápida.

ENTRE 2011 E 2013, A QUEBRA NO PIB É SUPERIOR A 7%, O QUE CORRESPONDE A 1,5 VEZES O DÉFICE ORÇAMENTAL FIXADO PELA "TROIKA" PARA 2013

O gráfico 1, construído com dados das Contas Nacionais Provisórias do INE publicadas em 2013 e do Orçamento retificativo de 2013, mostra com clareza o que aconteceu em Portugal após a entrada da "troika" e a entrada em funções do governo PSD/CDS.

Gráfico 1 – A queda do PIB em Portugal durante a "troika"
Gráfico 1.

Eliminando o efeito do aumento de preços, o valor do PIB, ou seja, o valor de toda a riqueza criada em Portugal em 2013 será inferior à que foi criada em 2010, em mais de 11.000 milhões €, ou seja, um valor muito superior ao valor do défice orçamental previsto. Portanto, admitindo que a previsão de recessão do governo (quebra de 2,3% do PIB) se verifique (e a experiencia já mostrou que este governo e esta "troika" nunca acertam nas previsões), a situação em 2014 será muito pior do que a existente no início de 2011. Mas não é apenas por esta razão que a situação é pior.

NO FIM DE 2013, EXISTIRÃO EM PORTUGAL MENOS 463 MIL EMPREGOS DO QUE NO INICIO DE 2011

O gráfico 2, construído com dados do INE e do Orçamento retificativo, mostra o ritmo de destruição de empregos em Portugal desde que a "troika" e este governo entraram em funções.

Gráfico 2 – A destruição de emprego em Portugal com a "troika" e com o governo PSD/CDS
Gráfico 2.

Segundo as previsões constantes do Orçamento retificativo de 2013 apresentado pelo governo, existirão em Portugal, no fim de 2013, menos 463.000 empregos dos que existiam no inicio de 2011. Esta redução brutal do emprego em Portugal significa que a politica imposta ao País pela "troika" e pelo governo PSD/CDS causou a destruição de 422 empregos por dia, incluindo sábados, domingos e feriados. Como consequência o desempego disparou, empurrando centenas de milhares de famílias para a miséria, e a única coisa que os "senhores" da "troika" e Vitor Gaspar têm para dizer aos portugueses é que é um "resultado surpreendente e não esperado" ou então, como escreveu o FMI, que se "enganaram". E com estas palavras procuram desresponsabilizar-se do que fizeram.

EM TRÈS ANOS DE "TROIKA" E DE GOVERNO PSD/CDS A DIVIDA PÚBLICA AUMENTOU EM 60 MIL MILHÕES €, O QUE TEVE COMO CONSEQUÊNCIA QUE OS JUROS TENHAM DISPARADO

Uma das grandes mentiras da "troika" e do governo PSD/CDS é que a sua politica levaria a uma contenção da divida e à sua redução. Mas o que aconteceu foi precisamente o contrário como mostra o gráfico 3 construído com dados do Boletim Estatístico do Banco de Portugal de 2013.

Gráfico 3 – O aumento da Divida Pública Total e externa com a "troika" e governo PSD/CDS
Gráfico 3.

Em 2 anos e um trimestre de "troika" e de governo PSD/CDS a divida pública externa aumentou em 36.000 milhões € e a divida pública total (que inclui também a interna) cresceu em 59,000 milhões €, ou seja, à média de 54 milhões € por dia, incluindo sábados, domingos e feriados. Este crescimento brutal da divida pública torna cada vez mais insustentável a situação do próprio Estado. Uma das consequências é o disparar dos juros, como mostra o gráfico seguinte.

Gráfico 4 – O aumento dos juros pagos pelo Estado com a "troika" e governo PSD/CDS
Gráfico 4.

Entre 2010 e 2013, os juros com a divida pública aumentaram em 53,7%, pois passaram de 4.850 milhões € para 7.454 milhões € o que está a tornar a situação insustentável. Para pagar aos credores, e não para pagar pensões e salários como tem afirmado Passos Coelho, o governo procedeu a um corte brutal na despesa pública (cortou salários e pensões, confiscou subsídios de ferias e de Natal, reduziu o subsidio de desemprego, o RSI, o direito ao abono de família, etc.) e fez um enorme aumento de impostos, para empregar as palavras do próprio Vitor Gaspar.

É evidente que esta situação se agravará ainda mais se a "troika" e o governo conseguirem levar para a frente a intenção já anunciada de proceder, até a 2015, a mais um corte na despesa pública de 4.700 milhões €, o que traduzir-se-ia em dezenas de milhares de despedimentos na Função Pública, agravando o desemprego no país; num corte muito grande nos salários e pensões; numa redução de serviços públicos essenciais à população, como a saúde, a educação e a segurança social, e lançaria o país numa recessão económica ainda maior que a atual.

PORTUGAL CHEGA A 2014 COM UMA DIVIDA PÚBLICA QUE JÁ NÃO CONSEGUE PAGAR E NESSA ALTURA DIZEM QUE O PAÍS TERÁ DE "IR AOS MERCADOS"

Se o povo português não conseguir pôr um travão nesta politica de destruição nacional levando o presidente da república a demitir o governo, Portugal chegará a 2014 a produzir muito menos do que em 2010, com um desemprego elevadíssimo, com uma divida pública que não conseguirá pagar, ou seja, numa situação pior que estava em 2011, e ainda com a necessidade de ir aos "mercados" para obter meios financeiros para pagar empréstimos que vencem nesse ano e nos anos seguintes, e cuja amortização só será possível com novos empréstimos. O único ponto positivo que os defensores desta politica conseguem apontar é a redução do défice externo, e mesmo este é temporário pois logo que o investimento e o consumo recupere o défice disparará. O gráfico 6, retirado do "site" do Instituto de Gestão de Crédito Público (IGCP) mostra mais uma outra "herança" que a "troika" e o governo PSD/CDS deixarão a Portugal com a sua politica.

Gráfico 5 – Divida Pública a médio e longo prazo
que Portugal terá de pagar em cada ano no período 2013-2045

Gráfico 5.

Portugal terá de pagar, em 2014, 14.110 milhões € de empréstimos que se vencem nesse ano; em 2015, o montante a amortizar já atinge 16.740 milhões €; em 2016, a divida a pagar é já de 16.740 milhões €; etc... E estes valores ainda não incluem a dívida a curto prazo, que é também elevada.

A questão que se coloca é a seguinte: Como é que um pais mergulhado numa profunda recessão económica, que perdeu uma parcela importante da sua riqueza anual, em que foram destruídos quase meio milhão de postos de trabalho, com um desemprego que atinge mais de um milhão e quinhentos mil portugueses, com um Estado profundamente endividado e a ter de pagar juros já incomportáveis, e ainda com um elevado défice orçamental, poderá pagar tal volume de empréstimos? A resposta é NÃO PODE PAGAR. E se recorrer aos mercados vai numa situação muito frágil e terá de se sujeitar a juros, prazos e condições que os grandes bancos, companhias de seguros e fundos, que dominam esses mercados, exigirem e que serão certamente incomportáveis para o país. Eis a situação que três anos de "troika" e de governo PSD/CDS levaram o país, colocando-o numa verdadeira armadilha que é preciso sair o mais rapidamente possível sob pena destes "senhores" condenarem Portugal e os portugueses a uma agonia e a um sofrimento grande sem fim à vista.
17/Junho/2013
[*] Economista, edr2@netcabo.pt , www.eugeniorosa.com

Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ .
18/Jun/13 

Palestra com Prof. Ricardo Augusto Felício na FAU – USP.

segunda-feira, 17 de junho de 2013

O significado mais profundo da espionagem em massa nos EUA

A verdade proibida: Os EUA estão a canalizar armas química para a Al Qaeda na Síria

A cegueira e a incapacidade de Vitor Gaspar e do governo para compreender o funcionamento da economia real e os problemas do país


por Eugénio Rosa [*]

Numa conferência de imprensa realizada em 23/5/2013, Vítor Gaspar, com aquele ar convencido que o carateriza, afirmou solenemente: "Chegou o momento do investimento. Repito, depois do ajustamento chegou o momento do investimento". E a medida que, segundo ele e Álvaro Santos, também presente, determinaria o milagre seria uma dedução no IRC, por investimentos até 5 milhões realizados até ao fim deste ano, de 20% do valor investido até ao máximo de 70%. Esta medida, segundo estes ministros, poderia determinar que a empresa pagasse, nos anos em que conseguisse aproveitar a dedução máxima permitida pela lei a ser publicada mas que ainda não foi, uma taxa de IRC de apenas 7,5%. E com base em tal incentivo fiscal Vítor Gaspar e o governo esperam que o milagre surja, ou seja, que o investimento dispare assim como a criação de emprego.

Mas uma coisa são as previsões/desejos fantasiosos de Vítor Gaspar e do governo, que já estamos habituados, e outra coisa muito diferente é a economia real. Para que o leitor possa avaliar se é ou não mais uma mentira de Vítor Gaspar e do governo para enganar a opinião pública, é importante ter presentes os seguintes factos e dados oficiais.

Em primeiro lugar, é preciso lembrar que já existe em Portugal o crédito fiscal com uma redução na taxa de IRC muito semelhante à agora anunciada pelo governo, e que isso não provocou um milagre a nível de investimentos, nomeadamente estrangeiro. A diferença é que a norma que existe aplica-se a investimentos superiores a 5 milhões €. Por ex., a Petrogal no investimento que realizou na renovação das refinarias obteve um crédito fiscal de 190,6 milhões €, ou seja, teve uma redução no IRC a pagar naquele montante; a Embraer, um grupo brasileiro, nos investimentos que realizou em Portugal obteve um crédito fiscal (redução) de 61,9 milhões € a nível de IRC. E mesmo com tais benefícios fiscais o investimento não disparou.

Mas será que a carga fiscal, e nomeadamente a atual taxa de IRC, é o obstáculo mais importante ao investimento em Portugal? Os gráficos seguintes retirados do Relatório do Banco de Portugal de 2012 respondem a essa questão.

Gráfico 1- Taxa de utilização da capacidade produtiva e fatores que impedem o investimento
Como mostra o gráfico da esquerda, em 2011 menos de 75% da capacidade produtiva do pais estava a ser utilizada (e a situação atual é certamente mais grave), portanto, em Portugal a capacidade produtiva é já excessiva para a atual procura agregada solvente tanto interna e como externa (não para as necessidades, nomeadamente internas). Por outro lado, e como revela o gráfico da direita, o principal fator limitativo que impede atualmente o investimento em Portugal, de acordo com os próprios empresários, é a " deterioração das perspetivas de venda ", as quais se agravaram de uma forma continua entre 2010 e 2012, sendo no último ano indicado por mais de 65% dos empresários para não investir.

É esclarecedor que, entre as razões apresentadas pelos empresários para não investir, não apareça a carga fiscal, e muito menos o IRC. Vítor Gaspar e Alvaro Santos ao procurar criar a ilusão de que com o "supercrédito fiscal", como a despropósito o Secretário de Estado de Assuntos Fiscais chamou, se verificaria uma inversão na situação de quebra continuada do investimento, estavam a substituir a realidade pelos desejos o que apenas mostra a sua incompetência ou então tinham o propósito de enganar a opinião pública. Toda esta trama torna-se mais clara quando se analisam as previsões oficiais do investimento em Portugal. Na proposta de alteração do Orçamento do Estado de 2013 que o governo apresentou em 31.5.2013 prevê, para este ano, mais uma redução no investimento (FBCF) de -7,6% (a OCDE prevê uma quebra de -10,6%), portanto o próprio governo não acredita no que diz. Em 2014, a OCDE prevê nova quebra. E isto, quando o investimento diminuiu em 2010/2012 mais de 30%.

Uma das causas mais importantes que está a levar à quebra brutal e continuada do investimento em Portugal, referida pelos próprios empresários, é precisamente a quebra na procura agregada determinada pela redução do consumo. Esta redução é causada pela diminuição do poder de compra da população, do consumo e do investimento público.

Perante tal situação, como pode o governo ter a "lata" de afirmar, como fizeram Vítor Gaspar e Álvaro Santos, que espera que o investimento aumente agora significativamente com a simples introdução do credito fiscal, quando o governo aumenta enormemente os impostos, como afirmou Vítor Gaspar, que reduz significativamente o rendimento disponível das famílias, chegando ao ponto de insistir em criar, como consta da proposta de orçamento retificativo apresentado, um imposto de 5% sobre o subsidio de doença e de 6% sobre o subsidio de desemprego o que significa um corte de quase 180 milhões € por ano no rendimento dos desempregados, e de mais de 20 milhões € por ano no rendimento dos trabalhadores atingidos pela doença. As próprias previsões do governo constantes da proposta de alteração do OE-2013 que acabou de apresentar apontam para mais uma redução, em 2013, do consumo privado em -3,2% e de -4,2% no consumo público. E a OCDE que acabou de apresentar novas previsões para Portugal, prevê que a procura interna diminua -5,1% em 2013, e -1,5% em 2014. E isto depois da procura interna ter diminuído em Portugal em 2011-2012, ou seja, com a"troika" e com o governo PSD/CDS, mais de 12%.

APÓS A ENTRADA DA "TROIKA" E DO GOVERNO PSD/CDS, E MESMO COM CRISE, AS DESIGUALDADES AUMENTARAM EM PORTUGAL

O gráfico seguinte, construído com dados do Relatório do Banco de Portugal de 2012 (pág. 112), mostra que, com a crise, as desigualdades aumentaram ainda mais em Portugal.


Segundo o próprio Banco de Portugal, após a entrada da "troika" e do governo PSD/CS verificou-se um aumento acentuado dos rendimentos de empresa e propriedade (Capital) e uma quebra significativa das remunerações nominais, sendo a quebra das remunerações reais muito maior. E isto porque o Estado transformou-se num instrumento de agravamento das desigualdades, na medida que suga os rendimentos aos que menos têm (trabalhadores, pensionistas,desempregados) para os dar aos credores, poupando os rendimentos do capital.
02/Junho/2013
[*] Economista, edr2@netcabo.pt , www.eugeniorosa.com

Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ .

domingo, 16 de junho de 2013

A Greve dos professores é um acto de civilização

por Raquel Varela

Um sistema educativo constituído por trabalhadores precários, caixeiros-viajantes desumanizados, sobrecarregados de burocracia, com parcos descontos para a segurança social, pondo em causa a vida digna dos que já estão reformados. Professores que ainda tinham direitos, entre os 40 e 60 anos, enviados para um gigante despedimento colectivo ou reformas antecipadas. Turmas atascadas de crianças mal-educadas, seleccionadas para o lixo do «ensino profissional», um eufemismo para saber usar um computador e dizer umas palavras de inglês para uns turistas verem, mantendo a força de trabalho criteriosamente adequada à desordem de um país baseado em baixos salários e exportações. Eis o cenário que os nossos professores estão com esta greve a combater. Não podemos ver nesta greve nada a não ser um acto de civilização, em defesa do bem-estar colectivo.

Para os historiadores, sociólogos do trabalho, afirmar que a greve prejudica tem o mesmo significado que afirmar que a chuva molha. Porque a greve, proibida durante tantos anos e conquistada com mortos e feridos, só é greve se prejudicar a produção, neste caso, a formação da força de trabalho. Sabemos, e não podemos deixar de lembrar aos que hoje trabalham, que a greve é-o porque pára a produção mas também porque pode criar mecanismos de solidariedade, criar fundos de greve (para suportar vários dias de greve), democratizar as estruturas de organização dos trabalhadores (plenários de escolas, assembleias abertas, dirigentes com cargos rotativos); a greve pode também mobilizar outros sectores de trabalhadores à sua volta – foi tudo isto que aconteceu no ano passado em Chicago, nos EUA, naquela que foi a mais importante, e vitoriosa, greve de professores, quando vários bairros de Chicago se mobilizaram, com fundos e acções em defesa dos professores.

A palavra desemprego hoje carrega este significado – os desempregados pressionam os salários dos que estão empregados para baixo, fazem-nos aceitar piores condições laborais.

Argumentei no último livro que coordenei que a estratégia da troika consiste, primordialmente, em reconverter o mercado de trabalho. Como? Transformar todos os trabalhadores do país em trabalhadores precários, isto é, pôr fim ao direito ao trabalho substituído por um estado em que se alterna entre a precariedade e o assistencialismo, os «rendimentos mínimos», quando se fica desempregado.

Um precário ganha em média menos 37%, se for formado menos 900 euros, se não for formado menos 300 euros. Há um número cada vez maior de pessoas eliminadas do mercado de trabalho – num processo de eugenização social da força de trabalho - mas o número dos que voltam ao mercado de trabalho ganhando muito menos aumenta também. Quer isto dizer que, tendencialmente, quem consegue voltar ao mercado de trabalho volta com um salário inferior. Por isso vivemos num país onde há cada vez mais gente desempregada e cada vez mais gente a ganhar o salário mínimo, salário mínimo que é a palavra mágica que contém em si (quase) tudo – bairros sociais degradados, má educação, brutalidade, violência, má alimentação, fome, apatia social.

Nenhum aluno será prejudicado se esta greve sair vencedora e conseguir o que pode, e está ao seu alcance:  reduzir o horário de trabalho, empregar mais professores, estender e melhorar a sua formação nas universidades (ampliar de novo os cursos superiores), devolver aos cursos de educação uma forte componente científica, dignificar o trabalho com salários decentes, acabar com o terror do medo de perder o emprego, diminuir o número de alunos por turma, impor o respeito pelos professores, por parte dos alunos e por parte de todos nós como sociedade – a reboque garantimos a sustentabilidade da segurança social porque com relações laborais protegidas e emprego os descontos para esta aumentam.

O que impressiona nesta greve não é que ela prejudica os alunos. É que ela é o derradeiro acto para salvar os alunos, uma geração inteira «queimada» por um Governo que nada tem para lhes oferecer a não ser um salário baixo ou um passaporte para a emigração, para países que, ao contrário dos anos 60, também eles estão a braços com desemprego crescente!

Vivemos abaixo das nossas possibilidades. Hoje um trabalhador, por força do desenvolvimento tecnológico, é 5,35 vezes mais produtivo do que em 1961, mais de 430% mais produtivo! Isso significa que produzimos riqueza social suficiente para ter turma de 10, 15 alunos, escolas amplas com espaços verdes, espaços de brincadeira, funcionários bem pagos e atentos; professores bem formados em cursos com extensão universitária de 5 ou 7 anos; aprendizagem de instrumentos musicais, teatro…

Esta greve aos exames defende a dignidade laboral de quem vê no acto educativo um acto de construção da civilidade, da educação, da candura, do amor a aprender, do respeito pelo outro, da ciência como meio de emancipação humana.

daqui http://blog.5dias.net/

quinta-feira, 13 de junho de 2013

Da vaidade das palavras

Um retorico do passado dizia que o  seu oficio era fazer que as coisas pequenas parecessem grandes e como tais fossem julgadas. Dir-se-ia um sapateiro que, para calçar pés pequenos, sabe fazer sapatos grandes. Em Esparta ter-lhe-iam dado a experimentar o azorrague por professar uma arte trapaceira e mentirosa. E Creio que Arquidamo que foi seu rei, não terá ouvido sem espanto a resposta de Tucídedes, ao qual perguntava qual era o mais forte na luta, se Péricles se ele: «Isso será difícil de verificar, pois quando o deito por terra, ele convence os espectadores que não caiu, e ganha». Os que com cosméticos caracterizam e pintam as mulheres fazem menos mal, pois é coisa de pouca perda não as ver ao natural, ao passo que estoutros fazem tenção de enganar, não já os olhos, mas o nosso juízo, e de abastardar e corromper a essência das coisas. Os Estados que longamente se mantiveram em boa ordem e bem governados, como o cretense e o lacedemónio, não tinham em grande conta os oradores.
Aríston defeniu sabiamente a retórica como a ciência de persuadir o povo: Socrates e Platão, como a arte de enganar e lisonjear:  e aqueles que isto negam na sua definição genérica, confirmam-no por toda a parte nos seus preceitos. (...)

(...) É um instrumento inventado para manipular e agitar turbas e multidões desordenadas, e que, à maneira da medicina, só se emprega nos estados doentes. Naqueles onde o vulgo, onde os ignorantes, onde todos, tudo puderam, como os de Atenas, Rodes e Roma, e onde as coisas estavam em perpétua tempestade, abundavam os oradores. E, na verdade, nesses Estados viam-se poucas personagens atingir grande reputação sem o socorro da eloquência. (...)


Michel de Montaigne - Ensaios

terça-feira, 11 de junho de 2013

Eles e nós


Três quartos da rede dos correios assegurada por entidades externas. Tudo pronto para a privatização dos CTT, incluindo o famoso banco JP Morgan, especialista em intoxicações financeiras. A banca está sempre pronta para prosperar à custa dos poderes públicos. Tudo então está pronto para mais uma machadada nas instituições de que é feita uma comunidade política digna desse nome. Assim se destrói um país. Cavaco, que iniciou esta moda das privatizações sem fim, com os seus espectaculares resultados, só pode apoiar, claro. De resto, e aplicando aqui os termos de Michael Sandel, no seu último e muito recomendável livro sobre os limites morais dos mercados, a privatização de mais um bem social não é apenas um problema de geração de desigualdade no seu acesso, mas também é um problema de corrupção, de subversão dos fins da instituição que o provisiona, de corrosão das normas sociais que lhe dão sentido, da ética dos seus profissionais e das relações laborais que a assegura, da confiança num serviço público fundamental. Os serviços públicos são um momento em que se conjuga a primeira pessoa do plural de que é feita uma comunidade. Se eles conseguirem privatizar os CTT, nós teremos de voltar a nacionalizá-los: esta é que é uma daquelas questões nacionais que tem de merecer o compromisso de uma imensa maioria, para usar um termo muito em voga ontem em Elvas. As verdadeiras questões nacionais são hoje profundamente subversivas ou não estivéssemos sob tutela de fora através das elites cá de dentro.

por João Rodrigues

http://ladroesdebicicletas.blogspot.pt/2013/06/eles-e-nos.html 

Miguel Sousa Tavares, afinal, está safo!

por PEDRO TADEU


Nem queria acreditar! O professor Cavaco Silva, num discurso oficial , enquanto Chefe do Estado, no Dia de Portugal e no pior ano que vivemos de crise, achou ser boa altura tentar reabilitar o seu passado como primeiro-ministro (José Sócrates tem, afinal, um mestre!) e resume assim 25 anos de política agrícola (dos quais os primeiros 10 comandou): "apesar de o número de agricultores ser então muito superior ao atual - cerca de 600 mil, contra cerca de 300 mil nos dias de hoje - a produtividade da terra cresceu 22% e a produtividade do trabalho agrícola aumentou 180%."
Cavaco Silva discursou aquele raciocínio sem se rir. Explicou querer desfazer assim "ideias feitas e preconceitos"... Como?!

Entre 1989 e 2009, o número de explorações agrícolas caiu 50% e a superfície agrícola utilizada diminuiu 9%. O valor acrescentado bruto criado pelo sector primário caiu de 10% para 2% - o peso do sector primário na riqueza criada no País dividiu-se assim por cinco.

A taxa de cobertura das importações pelas exportações de bens alimentares recuou de 43% em 1990 para 32% em 2010. Em 2007, mais de 50% do consumo alimentar em Portugal era importado, contra 35% em 1986.

Portugal era praticamente autossuficiente em 1986 em produtos como as hortaliças, as frutas, as carnes e o leite. Agora, importa grande parte do que come.

Portugal caiu de sétimo para 12.º lugar entre os países da União Europeia na representatividade económica do sector da agricultura, silvicultura e pescas.

Podia continuar com páginas e páginas de números, todos no mesmo sentido e sempre citando o elogiado estudo coordenado pelo professor Augusto Mateus para a Fundação Francisco Manuel dos Santos, "25 Anos de Portugal Europeu", que o DN publicou há dias.
Augusto Mateus não podia ser mais assassino para as intenções e para o texto do discurso presidencial de ontem: comparada com a Europa, lê-se no estudo, "a agricultura regista o maior gap face à média comunitária e foi o único sector cuja produtividade divergiu".

Um desastre completo para os muitos mil milhões investidos pelos fundos europeus e pelo Estado português na agricultura. Para o Presidente da República, porém, esta é uma ideia feita, um preconceito. Nós é que não entendemos!

Qual é o juiz, face a este exemplo presidencial de pantominice estatística, capaz de condenar Miguel Sousa Tavares por ter chamado palhaço a Cavaco Silva? E aquele tipo de falácia não afeta profundamente a dignidade da função presidencial? Não deveria a PGR processar o cidadão Cavaco Silva por ofender a Presidência da República?

http://www.dn.pt/inicio/opiniao/interior.aspx?content_id=3265060&seccao=Pedro%20Tadeu&tag=Opini%E3o%20-%20Em%20Foco&page=1 

segunda-feira, 10 de junho de 2013

O que os media corporativos não contam acerca da explosão social na Turquia

por LibreRed [*]


Um dos argumentos mais utilizados pelos grandes media de comunicação ocidentais quando se trata de interpretar a origem da explosão social nas ruas da Turquia é a deriva islâmica e autoritária do governo de Recep Tayip Erdogan.

Deste modo, os mass media centram toda a atenção na disjuntiva islamismo-laicismo e autoritarismo-democracia, fazendo uma análise simplista e parcial da realidade que vive estes dias o país euro-asiático.

Mas para analisar com maior profundidade a recente revolta popular nas ruas de cidades como Istambul ou Ancara seria preciso adoptar outra perspectiva e por a lupa nas políticas sócio-económicas que o executivo tem desenvolvido nestes últimos anos.

O governo de Erdogan, integrado pelo Partido Justiça e Desenvolvimento (AKP), chega ao poder no ano de 2002 num contexto de crise económica (crise financeira de 2001) onde acorda um programa de medidas de feitio claramente neoliberal com o Fundo Monetário Internacional (FMI) que passam pela privatização do sector público, reformas laborais e drásticos cortes sociais.

Um ano depois de chegar ao governo, em 2003, é aberto o caminho à privatização da empresa pública de telecomunicações Turk Telekom [1] . No ano seguinte, 2004, põem-se à venda companhias de bebida, fábricas de aço e a as Linhas Aéreas Turcas [2] .

Desde então, inicia-se um processo que não tem marcha-atrás. Em 2007, dá-se sinal verde à privatização da empresa pública de tabacos da Turquia, Tekel [3] . Em 2008, é a vez da rede eléctrica, com a venda de duas companhias de distribuição em Ancara e Sakarya-Kocaeli [4] . Além disso, nesse mesmo ano anuncia-se a venda de banco de propriedade estatal Halkbank e a privatização de 15 por cento das acções da Turk Telekom.

Em 2009, o governo aprova legislação para conceder a água dos rios, dos lagos e das albufeiras às corporações privadas. Isto significa que os recursos hídricos podem ser transferidos a corporações, que até então controlavam só os serviços de distribuição [5] .

Diante disto, a Confederação dos sindicatos camponeses turcos, Çiftçi-Sen, juntamente com mais de 100 outras forças de oposição social que defendem o reconhecimento do direito à água, constituem uma plataforma chamada "Não à comercialização da água" e manifestam-se maciçamente em 15 de Março de 2009 em Istambul no âmbito do Fórum Mundial da Água [6] .

Em 2011, o governo de Erdogan inicia as negociações para a privatização [7] de 2.000 quilómetros de auto-estradas e pontes do país. Desta maneira o executivo turco pretende ceder ao capital privado até nove rodovias com portagem e duas pontes sobre o Bósforo, vias de comunicação muito importantes na área de Istambul.

Através da chamada "Administração de Privatizações" (OIB na sua sigla em turco), Erdogan procurar fazer avançar um pacote de privatizações no país que inclui o têxtil, a mineração, o petróleo, a alimentação e o transporte marítimo, dentre outros sectores [8] .

Em Fevereiro desse mesmo ano, 10 mil pessoas manifestam-se no centro de Ancara em repúdio à reforma laboral do governo que, entre outras medidas, inclui a redução do salário mínimo para os jovens, a possibilidade de transferência dos funcionários e permite a contratação de empregados sem seguro social [9] .

Muitos dos presentes à manifestação gritam em coro: "Isto é Ancara, não o Cairo", "Tayyip, chegou a sua vez" e "Tayyip, te desejamos um final [tão] feliz como o de Mubarak".

As directrizes neoliberais aplicadas durante estes últimos anos geraram um aumento da desigualdade social no país. Segundo a revista Forbes, em Istambul, capital financeira da Turquia, havia um total de 35 multi-milionários em Março de 2008 (em comparação com 25 em 2007), situando-se em 4º lugar no mundo. Um relatório para empresários interessados em investir na Turquia elaborado pelo banco espanhol Banesto assegura que "o país está marcado pela existência de fortes desigualdades de rendimento" [10] . Muitos empregados na Turquia não ganham mais que o salário mínimo de 570 dólares e o rendimento per capita é quase a metade dos rendimentos médios europeus.

Talvez este conjunto de factores ajude a explicar o mal-estar social que deu origem aos distúrbios hoje vividos na Turquia, para além do enfoque liberal que a imprensa do Ocidente pretende dar dos mesmos.
 
Referências:
[1] elpais.com/diario/2003/11/12/economia/1068591610_850215.html
[2] spanish.peopledaily.com.cn/spanish/200402/12/sp20040212_72471.html
[3] www.icex.es/...
[4] www.hispanatolia.com/...
[5] www.tni.org/
[6] www.eurovia.org/spip.php?article67&lang=fr
[7] www.cincodias.com/... as/turquia-inicia-privatizacion-2000-kilometros-autopistas/20110830cdscdiemp_16/
[8] www.oib.gov.tr/index_eng.htm
[9] http://www.abc.es/agencias/noticia.asp?noticia=677519
[10] comercioexterior.banesto.es/...


Ver também:

  • La policía turca ataca sedes del Partido Comunista
  • Masivas marchas en distintas ciudades turcas exigen la dimisión del Gobierno
  • http://occupygezipics.tumblr.com/
  • Esbozos sobre la Condición de la Clase Obrera en Turquía

  • Líder da oposição clama por eleiçõs antecipadas

    O original encontra-se em http://www.librered.net/?p=27218


    Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ .
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