quinta-feira, 2 de outubro de 2014

As fontes subterrâneas de poder




A economia Norte Americana precisa dos minerais da América Latina como os pulmões precisam de ar.

«Os astronautas já tinham imprimido as primeiras marcas humanas sobre a superfície da lua, quando, em Julho de 1969, o pai da façanha, Werner von Braun, anunciava à imprensa que os Estados Unidos se propunham a instalar uma longínqua estação no espaço, com propósitos bem mais próximos: “Desta maravilhosa plataforma de observação - declarou - poderemos examinar todas as riquezas da Terra: os poços de petróleo desconhecidos, as minas de cobre e de zinco...”

O petróleo continua a ser o principal combustível de nosso tempo, e os norte-americanos importam a sétima parte do petróleo que consomem. Para matar vietnamitas, precisam de balas, e balas precisam de cobre: os Estados Unidos compram fora de suas fronteiras a quinta parte do cobre que gastam. A falta de zinco se torna cada vez mais angustiosa: cerca da metade vem do exterior. Não se pode fabricar aviões sem alumínio, e não se pode fabricar alumínio sem bauxita: os Estados Unidos quase não têm bauxita. Seus grandes centros siderúrgicos - Pittsburgh, Cleveland Detroit - não encontram ferro suficiente nas jazidas de Minnesota, que estão a caminho de se esgotarem, nem têm o manganês de que necessita. Para produzir motores do retropropulsão, não contam com níquel nem com cromo em seu subsolo. Para fabricar aços especiais, é preciso ter tungsténio:Importam a quarta parte.

Esta dependência crescente, em relação aos fornecimentos externos, determina uma identificação também crescente dos interesses capitalistas norte-americanos na América Latina com a segurança nacional dos Estados Unidos. A estabilidade interior da primeira potência do mundo está intimamente ligada às inversões norte-americanas ao sul do rio Bravo. Cerca da metade destas inversões é dedicada à extracção de petróleo e à exploração de riquezas minerais, “indispensáveis para a economia dos Estados Unidos, tanto na paz como na guerra”. O presidente do Conselho Internacional da Câmara de Comércio do país do norte o define assim: “Historicamente, uma das razões principais de os Estados Unidos para investirem no exterior é o desenvolvimento de recursos naturais, particularmente minerais e, mais especialmente, o petróleo. É perfeitamente óbvio que os incentivos deste tipo de inversões devam ser incrementadas. Nossas necessidades de matérias-primas estão em constante aumento, na medida em que a população se expande e o nível de vida sobe. Ao mesmo tempo, nossos recursos domésticos se esgotam...”

Os laboratórios científicos do governo, das universidades e das grandes corporações envergonham a imaginação com o ritmo febril de suas invenções e descobertas, mas a nova tecnologia não encontrou a maneira de prescindir dos materiais básicos que a natureza, e só ela, proporciona. Vão-se debilitando, ao mesmo tempo, as respostas que o subsolo nacional é capaz de dar ao desafio do crescimento industrial dos Estados Unidos. »

(...)

«Para abastecer-se da maior parte dos minerais estratégicos que se consideram de valor crítico para seu potencial de guerra, os Estados Unidos dependem das fontes externas.

“O motor de retropropulsão, a turbina de gás e os reactores nucleares têm hoje uma enorme influência sobre a demanda de materiais que só podem ser obtidos no exterior”, diz Magdoff neste sentido. A imperiosa necessidade de materiais estratégicos, imprescindíveis para salvaguardar o poder militar e atómico dos Estados Unidos, está claramente vinculada à maciça compra de terras, por meios geralmente fraudulentos, na Amazónia brasileira.

Na década de 60, numerosas empresas norte-americanas, conduzidas pela mão de aventureiros e contrabandistas profissionais, se lançaram num rush febril sobre esta selva gigantesca. Previamente, em virtude do acordo firmado em 1964, os aviões da Força Aérea dos Estados Unidos haviam sobrevoado e fotografado a região. Utilizaram Equipamentos de cintilómetros para detectar jazidas de minerais radioactivos pela emissão de ondas de luz de intensidade variável, electromagnetrômetros, para radiografar o subsolo rico em minerais não ferrosos, e magnetómetros para descobrir e medir o ferro. Os informes e as fotografias obtidas no levantamento da extensão e profundidade das riquezas secretas da Amazónia foram postos em mãos de empresas privadas, interessadas no assunto, graças aos bons serviços do Geological Survey do governo dos Estados Unidos.

Na imensa região, comprovou-se a existência de ouro, prata, diamantes, gipsite, hematita, Magnetita, tantálio, toro, urânio, quartzo, cobre, manganês, chumbo, sulfatos, potássios, bauxita, zinco, zircónio, cromo e mercúrio. O céu da selva virgem de Mato Grosso até as planuras do sul de Goiás é tão aberto que, segundo o delírio da revista Time, em sua última edição latino-americana de 1967, pode-se ver ao mesmo tempo o sol brilhante e alguns relâmpagos de tormentas diferentes. O governo tinha oferecido isenções de impostos e outras vantagens para colonizar os espaços virgens deste universo mágico e selvagem.

Segundo o Time, os capitalistas estrangeiros tinham comprado antes de 1967, a sete centavos o acre, uma superfície maior do que a que somam os territórios de Connecticut, Rhode Island, Delaware, Massachusetts e New Hampshire. “Devemos manter as portas abertas à inversão estrangeira - dizia o director da SUDAM, agência governamental para o desenvolvimento da Amazónia -, porque necessitamos mais do que podemos obter.”Para justificar o levantamento aerofotogramétrico por parte da aviação norte-americana, o governo tinha declarado, antes, que carecia de recursos. Na América Latina é o normal: sempre entregam os recursos ao imperialismo em nome da falta de recursos.»


As veias abertas da  América Latina  (Eduardo Galeano)

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