domingo, 12 de abril de 2015

Elogio dos sindicatos

por Serge Halimi

Já que toda a gente se mostra preocupada com o enorme crescimento das desigualdades, por que é que esta análise do Fundo Monetário Internacional (FMI) passou despercebida [1]? Terá sido por causa das suas conclusões? Num estudo apresentado em Março último, dois economistas oriundos deste templo do liberalismo salientam «a existência de uma ligação entre a queda da taxa de sindicalização e o aumento da parte dos rendimentos mais elevados, nos países avançados, durante o período 1980-2010». Como explicam eles esta ligação? «Reduzindo a influência dos trabalhadores nas decisões das empresas», o enfraquecimento dos sindicatos permitiu «aumentar a parte dos rendimentos constituída pelas remunerações dos altos dirigentes e dos accionistas».

Segundo estes economistas do FMI, «cerca de metade» do aprofundamento das desigualdades que os liberais tradicionalmente preferem atribuir a factores impessoais (globalização, tecnologias, etc.) decorreria do declínio das organizações dos trabalhadores. Será isto surpreendente? Quando o sindicalismo, ponto de apoio histórico da maior parte dos avanços emancipadores, se apaga, tudo se degrada, tudo se fragmenta. A sua anemia só pode agudizar o apetite dos detentores do capital. E a sua ausência só pode libertar um espaço que é de imediato invadido pela extrema-direita e pelo fundamentalismo religioso, dedicando-se ambos a dividir grupos sociais cujo interesse seria mostrarem-se solidários.

Ora, o apagamento do sindicalismo não é um acaso nem uma fatalidade. Em Abril de 1947, quando o Ocidente se prepara para conhecer trinta anos de prosperidade um pouco mais bem partilhada, Friedrich Hayek, um pensador liberal que marcou o seu século, esboça já o roteiro dos seus amigos políticos: «Se queremos manter a mais pequena esperança de um regresso a uma economia de liberdade, a questão da restrição do poder sindical é uma das mais importantes». Nessa altura Hayek prega no deserto, mas algumas décadas mais tarde, graças à intervenção directa – e brutal – de dois dos seus admiradores, Ronald Reagan e Margaret Thatcher, durante conflitos de trabalho marcantes (os controladores aéreos americanos em 1981, os mineiros britânicos em 1984-1985), o «poder sindical» foi morto. Entre 1979 e 1999, o número anual de greves que envolveram pelo menos mil trabalhadores passou, nos Estados Unidos, de duzentos e trinta e cinco para dezassete; o de dias de trabalho «perdidos» passou de vinte milhões para dois milhões [2]. E a percentagem do salário no rendimento nacional recuou… Em 2007, mal foi eleito presidente da República francesa, Nicolas Sarkozy aprovou, por sua vez, uma lei que restringiu o direito de greve nos serviços públicos. No ano seguinte, regozijava como um garoto feliz: «Agora, quando há uma greve em França ninguém se apercebe».

Em boa lógica, o estudo do FMI devia ter insistido na urgência social e política de reforçar as organizações dos trabalhadores. Mas, em vez disso, considera que «continua por determinar se o aprofundamento das desigualdades devido ao enfraquecimento dos sindicatos é bom ou mau para a sociedade»… Os que já têm uma pequena ideia da resposta retiraram dela, sem dificuldade, a conclusão que se impõe.

sexta-feira 10 de Abril de 2015

Notas

[1] Florence Jaumotte e Carolina Osorio Buitron, «Le pouvoir et le peuple», Finances & Développement, Washington, Março de 2015.
[2] George Melloan, «Whatever happened to the labor movement?», The Wall Street Journal, Nova Iorque, 4 de Setembro de 2001.

aqui:http://pt.mondediplo.com/spip.php?article1050

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