segunda-feira, 15 de novembro de 2010

José Saramago , discurso de Estocolmo

«As injustiças multiplicam-se no mundo, as desigualdades agravam-se, a ignorância
cresce, a miséria alastra. A mesma esquizofrénica Humanidade que é capaz de enviar
instrumentos a um planeta para estudar a composição das suas rochas, assiste
indiferente à morte de milhões de pessoas pela fome. Chega-se mais facilmente a Marte
neste tempo do que ao nosso próprio semelhante.

Alguém não anda a cumprir o seu dever. Não andam a cumpri-lo os governos, porque não sabem, porque não podem, ou porque não querem. Ou porque não lho permitem aquelas que efectivamente governam o mundo, as empresas multinacionais e pluricontinentais cujo poder, absolutamente não democrático, reduziu a quase nada o que ainda restava do ideal da democracia. Mas também não estão a cumprir o seu dever os cidadãos que somos. Pensamos que nenhuns direitos humanos poderão subsistir sem a simetria dos deveres que lhes correspondem e que não é de esperar que os governos façam nos próximos 50 anos o que não fizeram nestes que comemoramos. Tomemos então, nós, cidadãos comuns, a palavra. Com a mesma veemência com que reivindicamos direitos, reivindiquemos também o dever dos nossos deveres. Talvez o mundo possa tornar-se um pouco melhor.»

José Saramago

Estocolmo, 10 de Dezembro, 1998





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